O CRB e a camisa encharcada pelo feitiço do futebol
Por Victor Mélo
Diogo Silva abriu os braços e só esperou o estrondo. Mãos espalmadas, salto para o lado direito. O movimento simples, treinado, parece ter feito ali mesmo um acordo com o tempo. A defesa, do nada, fez a convenção dos relógios perder o sentido.
Não duvido que alguns rodaram para trás pouco depois do chute enviesado de Marcos Rocha. Era o último pênalti. O som da bola tocando na luva antecedeu o grito. A voz inflamada escalou a garganta, se espalhou pelo estádio do Palmeiras e ganhou a noite de Maceió.
Não havia mais distância. O time de vermelho venceu o jogo e, mais do que isso, a imaginação. Era difícil pensar naquele desfecho. O CRB, se não fosse tomado pela glória, estancaria no Palmeiras.
“Não dá”, dizia a inabalável maioria, antes do jogo. “O time deles é o atual campeão da Copa do Brasil e outro dia conquistou a Taça Libertadores. Olha lá: eles ganham até na foto”.
Talvez, os próprios jogadores do CRB tivessem dificuldade de acreditar na vitória, mas os sinais naquele campo de São Paulo mostravam um clarão. Um gol aos cinco minutos de Ewandro. Um passe sem olhar de Don Diego. Uma bola tirada em cima da linha pelo capitão de vermelho. Aos 35 anos, o guerreiro Gum conhece os atalhos. Duas, três, nove bolas defendidas por Diogo.
Depois dos 30 do segundo tempo, não havia mais dúvida. A camisa do CRB estava encharcada pelo feitiço do futebol. Tinha o peso da raça. Não acontece sempre, são poucos os times que merecem, mas quando acontece tem o poder de acender a noite, de enfeitar o sol. O feito vira memória, loucura e corre aflito pelo corredor do tempo. Passa por gerações, encanta o novo e renasce em outros gols do futuro.
No meio de campo, neste instante, o passado, o presente e o futuro fazem uma animada ciranda. Eufóricos. De mãos dadas, às lágrimas, eles e os 18 jogadores celebram hoje o CRB nos tempos do cólera e temperam a quentura do vermelho.
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