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Edivan Rodrigues

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Lei de Chico de Brito

16/02/2010 às 09h05

Por Francisco Cartaxo

Escutei inúmeras vezes minha mãe e suas três irmãs relatarem, entre muxoxos e longos silêncios, as perseguições sofridas por meu avô, José Joaquim de Brito, pelos cabras do padre Cícero. A memória guardou este episódio impressionante. Para não ser aprisionado ou morto, meu avô materno escondera-se no mato próximo à casa grande onde morava e só regressava altas horas da noite, após certificar-se de que não havia estranhos na redondeza. A comida era levada pela filha mais velha, então menina-moça, que recebia da mãe a recomendação de dizer, se indagada, que o pai viajara para Fortaleza. Aliás, resposta verossímil, pois era sua rotina como negociante em Várzea Alegre, no início do século 20. A cena aqui resumida com frieza era narrada com emoção nas cores do medo, da ansiedade, da inquietação dominante numa família de fazendeiro/comerciante de porte médio. Apolítico, assegurava repetidas vezes minha mãe, sempre que eu queria conhecer as causas da perseguição a meu avô. O máximo que extraia das quatro irmãs era um “quem não era fanático do padre Cícero virava inimigo” e como tal sujeitava-se a toda sorte de molestamento.

José Joaquim de Brito, meu avô, se transferiu de Várzea Alegre para São João do Rio do Peixe “forçado a mudar de terra, em face das perseguições que sofreu após a vitória da Sedição de Juazeiro, em 1.914”, como registra o estudo genealógico de Mozart Soriano Aderaldo “Rolins, Cartaxos e Afins”, (Fortaleza, 1960). Nas leituras que faço de livros, ensaios, artigos e crônicas a respeito da história cearense, tento identificar um mínimo traço, por mais tênue que seja, da tragédia que se abateu sobre a família de minha mãe, obrigada a migrar para lugares estranhos, deixando os negócios de gado e comércio ao Deus dará.

Por que, sem envolvimento político explícito, teria José Joaquim de Brito pago tão elevado preço? Seria função do sobrenome? Explico. Reza a tradição oral, encampada por textos históricos, que quando o major do Exército, Franco Rabelo, assumiu o governo cearense, sob à égide salvacionista do marechal Hermes da Fonseca, os chefes políticos da oposição à mais longa oligarquia cearense, chefiada por Nogueira Accioly, passaram a tomar o poder local na marra. Assim fez no Crato o coronel Francisco José de Brito (Chico de Brito), desalojando da prefeitura o coronel Antônio Luiz Alves Pequeno. Na ocasião, teria havido entre os dois coronéis o seguinte diálogo:
Desocupe o cargo que, de hoje em diante, quem manda aqui sou eu.
Baseado em que lei?, perguntou o coronel Antônio Luiz
Nesta aqui, ó!, respondeu Chico de Brito, apontando o revolver para o adversário.

Vem daí a famosa lei de Chico de Brito. Teria sido meu avô, José Joaquim de Brito, vítima do parentesco (real ou apenas presumido) do rancoroso coronel Chico de Brito? Ou a versão familiar, ouvida anos seguidos de minha mãe e minhas tias, era uma nuvem para encobrir as ligações políticas de meu avô? Difícil saber a verdade. Todavia, se vivas fossem, as filhas do meu avô, católicas praticantes, as quatro, estariam escandalizadas com o esforço da Igreja em reabilitar padre Cícero Romão Batista para, no futuro, torná-lo santo.

Edivan Rodrigues

Edivan Rodrigues

Juiz de Direito, Licenciado em Filosofia, Professor de Direito Eleitoral da FACISA, Secretário da Associação dos Magistrados da Paraíba – AMPB

Contato: [email protected]

Edivan Rodrigues

Edivan Rodrigues

Juiz de Direito, Licenciado em Filosofia, Professor de Direito Eleitoral da FACISA, Secretário da Associação dos Magistrados da Paraíba – AMPB

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