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Médico sousense publica artigo com os erros cometidos pelo Brasil meio à pandemia de coronavírus

Se o Brasil fosse um paciente, como médico, diria que: “São sinais que o paciente que não quer aceitar e se adequar ao tratamento, assim, sofre mais, complica mais, morre mais...”

Por Campelo Sousa

15/05/2020 às 11h10 • atualizado em 15/05/2020 às 11h42

Médico Felipe Rocha publicou artigo falando da COVID-19

Com o Brasil chegando na casa dos 200 mil casos e mais de 13 mil mortos, como médico venho sempre questionando quais erros este país de dimensões continentais vem cometendo no combate à COVID-19, para tanto vou elencar alguns pontos que estão relacionados ao quadro atual e crescente que vivemos:

1) As eleições não terminaram

– Antes mesmo de termos a problemática global, no Brasil já se vivia e sentia que as acirrações políticas vividas no último processo eleitoral se mantiveram ativas, por ambos os lados. Se pelo lado derrotado a sensação de fazer uma “oposição a todo custo”, com vãs polemizações, criação de “consórcio de governadores” para passar por cima das ordens da União e a tentativa de manter o ‘clima pesado’ a todo momento, tentando criar uma instabilidade política recorrente, o lado vitorioso não foi diferente. O presidente entrou num status de “achar o inimigo”, onde vinha criando problemas entre seus correligionários, opositores, ministros, governadores, prefeitos, STF e etc.

Sempre invocando manifestações com sua ala mais ‘radical’, para demonstrar um suposto apoio popular e assim tentar manter a popularidade que lhe concedeu o cargo. Nesta batalha de egos, perdeu quadros importantes de seu governo, além de fortes aliados.

2) A falta de entendimento do que é o “Federalismo”

– Devido aos problemas supracitados, mesmo antes da pandemia, já não se havia o respeito e entendimento do que se entende por “Federalismo”. A recorrente judicialização de ações da União, a criação de ‘consórcios de governadores do nordeste’ quase como um grito separatista, ações isoladas e ferindo a autonomia dos poderes, decisões monocráticas interferindo as ações que deveriam partir da União e ser replicada nos estados já não funcionava adequadamente, uma clara batalha de cordas entre os poderes.

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3) Falta de Centralização e Planejamento Estratégico

– Neste tópico, podemos até separar em duas partes: as Ações da União e as falas do Presidente, a segunda influi completamente na segunda.

Enquanto o presidente minimizava os efeitos da crise que já se alastrava na Europa, bem mal assessorado pelos seus mais apoiadores fiéis, com falas no sentido de “gripezinha”, isto não condizia com as ações que o Ministério da Saúde tentava implementar. Isto se demonstrou claramente quando após reunião com os governadores, Bolsonaro voltou a minimizar a pandemia. Enquanto o ainda ministro Mandetta se reunia com secretários estaduais de saúde, o Pr quebrava o isolamento necessário após viagem aos EUA e se abraçava com manifestantes à frente do Palácio da alvorada, criticava o isolamento e, novamente, atacava governadores.

Tudo isso foi criando um clima de incerteza e desconfiança de que o Presidente não acataria, como não acatou, as decisões tomadas pelo Ministério da Saúde, e em uma briga de poderes já estabelecida, cada estado começou a tomar suas próprias decisões a respeito do vírus. Então cidades sem nenhum caso confirmado já estava decretando “Lockdown” devido ás manchetes televisivas e digitais informar que havia “transmissão comunitária” no país. Isto trouxe pânico precoce e surreal em cidadezinhas do interior, que já estavam decretando “Estado de Calamidade” sem que houvesse um óbito num raio de 1000km.

A perda da centralização das ações foi fundamental para a crise econômica e social das cidades, não se podia tomar “as mesmas condutas para pacientes diferentes” e isto só é possível criando um plano estratégico nacional de ações, onde deveriam ser instituídos níveis diferentes de ações estratégicas a serem implementadas a partir da disseminação do vírus no país, inclusive em se tratando do benefício do “Auxílio Emergencial”. As diferenciações de ações de prevenção e tratamento são distintas e complementares e não se deverias dar “o mesmo remédio” a todas as cidades.

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4) 27 países diferentes no Brasil
– Com isso, cada estado tomou pra si a toga de resolver a problemática sozinho, fechado inconsequentemente fronteiras, decretando Estado de Calamidade Pública, “Lockdowns” aletórios e sem critérios bem estabelecidos, rodízios de carros ocasionado superlotação dos transportes públicos, a corrida inconsequente e superfaturada dos respiradores(muitos com defeitos), onde a lei de quem tem o melhor esquema de corrupção impera.

Já não havia (há) um norte quando se trata da crise. Cada estado decide, impõe, o que lhe convém. O pico da pandemia já não se sabe quando é, cada estado usa o seu critério e nós temos um governo federal inepto sem o controle das rédeas da situação, ainda buscando inimigos para desviar o foco da situação.

5) Politização do Tratamento
– Por se tratar de uma doença nova, ainda não há vacina para a mesma, os tratamentos ainda carecem de embasamento científico e não há só UMA medicação que resolva a problemática. Estudos vem sendo feitos aos montes, vários com erros metodológicos graves, muitos promissores outros nem tanto, porém, ainda hoje a prática médica e a comunicação entre quem já passou do pico em outros países é a evidência mais forte(mesmo que metodologicamente fraca) no tratamento dos paciente, com uso de várias substâncias promissoras para evitar que a doença atinja níveis orgânicos de falência dos órgãos, mas ratificando não existe UMA DROGA SALVADORA.

Bolsonaro trouxe pra si a pecha de ‘salvador’ quando aposta na supostamente eficiente “Cloroquina”, que apesar de ter resultados interessantes, ainda tem suspeições sobre a sua eficácia e, como supramenicionado, não é a única droga a ser utilizada e ser a salvadora de todos os problemas. Ele agiu semelhante em 2016, quando entrou com uma ação no STF para a liberação da “pílula do câncer”, a fosfoetalonamina, onde inclusive foi sancionada pela então presidente Dilma liberando o uso e fabricação. Meses mais tarde, não foi comprovada sua eficácia, o STF barrou a liberação e estudos mais sérios demonstram a sua incapacidade de combater o câncer. Portanto, o presidente persiste no erro de se agarrar à um tronco que afunda facilmente, deveria deixar para a ciência gerir sobre esses casos, com o suporte do ministério da saúde gerindo e sugerindo os tratamentos adequados e atualizados de acordo que as evidencias vem se mostrando e não seguir os passos de protocolos estabelecidos por redes privadas, como o Prevent Senior, e mantendo viva a politização do tratamento.

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6) Embates de prioridades: Econômica X Saúde
– Com a nítida falta de capacidade de dialogar com quem seja de fora de sua bolha ideológica, Bolsonaro, agarrado à suposta cura milagrosa da Cloroquina e o completo desentendimento da questão de saúde pública, começou a travar este embate: O que é pior: morrer gente ou parar a economia? A sua falta de capacidade de diálogo com os que pensam diferente e as suas declarações minimizando os efeitos danosos à população fez parecer que o mesmo não se importara com a saúde, visto que a dita “gripezinha” não atingiria a população economicamente ativa. Entretanto este não é um debate dicotômico, mas sim plural e complexo, em que nenhuma variável pode ser excluída do processo. Esse embate foi crucial para a queda do ministro da saúde, Henrique Mandetta, para a exacerbação das críticas de entidades globais, para a piora da relação com os governadores e descompasso com as próprias medidas econômicas proposta durante a crise. Ficou a mensagem que o Presidente iria cuidar apenas da questão econômica e que a saúde ficaria a critério dos estados, ao passo que se a economia estagnasse a culpa seria dos governadores. Como consequência desses atos, prejudicou-se a economia onde não havia ainda pandemia e prejudicou a saúde onde a mesma já se estava instalada, um querendo responsabilizar o outro pelas perdas de vidas e crise econômica anunciada.

7) Dificuldade (inaptidão) em reconhecer os erros
– Neste circo de horrores em que se tornou a pandemia, até os mais fortes aliados internacionais, como o Presidente Trump, já reconheceu os riscos não só econômicos, mas de saúde pública que o COVID-19 está causando, tratando com a seriedade necessária a problemática e tecendo críticas, ainda suaves, em relação ao Brasil, porem com possibilidade de acentuação dessas crítica e suspensão de voos BRA-EUA. Vizinhos sulamericanos endossam e ampliam essas críticas colocando em xeque a relação com vizinhos e a liderança, sempre bem estabelecida, nas tomadas de decisões futuras sobre o bloco do Mercosul.

Se ainda temos moderados índices de mortos/milhão de habitantes, o número absoluto já impressiona, ultrapassando países 5 vezes mais populosos como China e Índia, ficando a sensação de que estes números tendem a crescer importantemente nos próximos dias.
Para piorar, nada se aprendeu com a equivocada demissão do Mandetta, onde o (tenho certeza) capaz ministro Teich caiu de paraquedas e apesar de ser competente padece dos mesmos atos inconsequentes do Presidente, onde passa por cima de decisões prévias, toma decisões impulsivas e equivocadas e não informa aos seus subordinados, causando desconforto e perplexidade. Tudo isso demonstra que ainda o Bolsonaro dá “murros n’água”, segue mal assessorado e não sabe (não quer saber) da gravidade atual do quadro da Pandemia no Brasil.

Se o Brasil fosse um paciente, como médico, diria que: “São sinais que o paciente que não quer aceitar e se adequar ao tratamento, assim, sofre mais, complica mais, morre mais…”

Felipe Rocha
Médico – CRM/PB 8009

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