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Adjamilton Pereira

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Teresa do Cacete

18/05/2011 às 10h39

O porte elegante contrastava com as roupas displicentemente sobrepostas e que formavam a figura bizarra que perambulava pelas ruas da cidade conversando com seres imaginários. A fala articulada revelava, segundo alguns, o passado de professora. O desencanto e a vida errante foi a opção que restou, segundo outros, após uma forte desilusão amorosa. Entre duvidas e poucas certezas, a figura quixotesca circulava pelas ruas centrais da cidade, recebendo o sarcasmo de alguns, a zombaria de tantos e a compaixão de poucos.

Caminhava elegantemente. No rosto um vermelho batom que mal aplicado esborrava pelo rosto como a marcar uma fictícia máscara de um palhaço do cotidiano fazendo graça de seu próprio infortúnio. Na cabeça uma trouxa de farrapos que acumulava em suas peregrinações por casas amigas onde recebia doações de alimentos e roupas usadas. Na mão um cacete que lhe emprestava certa postura de nobreza. Esse indumentário lhe valeu o apelido: Teresa do Cacete.

As saias rodadas imitavam sinhazinhas de um tempo perdido entre sobrados e casarões amarelados em antigas fotografias. O andar ligeiro como a escapar da mesmice e do marasmo de uma vida de insignificância e desprazeres. Sempre me encontrava e sapecava um forte abraço e um beijo no meu rosto, manchando cada vez mais o batom borrado em seu rosto. Trocava algumas palavras desconexas e pedia dinheiro para comprar um sabonete. Dizia, em sua exuberante majestade: – Quero ficar cheirosa. E escapava em busca de alguma loja onde seu simples desejo fosse parcialmente atendido.

Não sei onde morava. A via sempre pelas ruas da cidade. Em inúmeras ocasiões dormia em terraços de casas amigas ou no adro da Catedral. E foi em uma dessas suas dormidas improvisadas em locais indevidos que foi vítima da insanidade e da violência. A agressão que sofreu lhe deixou não apenas marcas físicas, mas talhou seus sentimentos e maculou sua crença na generosidade dos homens. Seus agressores ficaram impunes e Teresa mais amedrontada em caminhar pelas ruas da cidade onde, desde pequena, construiu seu reino imaginário e onde edificou castelos de ilusão.

Não sei se ainda está viva. Não mais a vejo andando pelas ruas centrais da cidade. Apenas me veio na lembrança sua figura como retirada de um romance fantasioso e mirabolante. Talvez não mais esteja viva, mas permanece presente em minhas memórias como a perfilar a galeria de tantos anônimos e anônimas figuras que, ao longo dos tempos quebra a rotina da normalidade urbana, nos lembrando que os rotulados de loucos são apenas formas diferentes de encarar a vida.
 


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Adjamilton Pereira

Adjamilton Pereira

Adjamilton Pereira é Jornalista e Advogado, natural de Cajazeiras, com passagens pelos Jornais O Norte e Correio da Paraíba, também com atuação marcante no rádio, onde por mais de cinco anos, apresentou o Programa Boca Quente, da Difusora Rádio Cajazeiras, além de ter exercido a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cajazeiras.

Contato: [email protected]

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Adjamilton Pereira é Jornalista e Advogado, natural de Cajazeiras, com passagens pelos Jornais O Norte e Correio da Paraíba, também com atuação marcante no rádio, onde por mais de cinco anos, apresentou o Programa Boca Quente, da Difusora Rádio Cajazeiras, além de ter exercido a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cajazeiras.

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