Outra face de João de Manezim
Em vida ele foi homem de sete instrumentos, de muitos amores e muitos filhos. De criatividade sem limites. Após a morte, sua personalidade multifacetada tem sido realçada por companheiros, amigos, admiradores ou simples conhecidos. Nesta última categoria me incluo. Morando quase a vida toda fora de Cajazeiras, não mantive com João Rodrigues laços estreitos de camaradagem. Mesmo assim quero juntar esta crônica a tudo que já foi dito acerca desse cajazeirense singular. Para isso, relembro dois episódios da história política de Cajazeiras, vividos na eleição de 1982, nos quais João de Manezim se fez personagem.
O primeiro fato se deu no debate no Grêmio Artístico realizado entre candidatos a governador da Paraíba e a prefeitos de Cajazeiras. Wilson Braga, único candidato ausente, fez-se representar pelo suplente de senador Bosco Barreto, numa evidente provocação. Ora, Bosco rompera com o PMDB, passando de mala e cuia para o PDS, e carregava nos ataques irreverentes contra Antônio Mariz, candidato da oposição. Boa parte do salão do Grêmio foi ocupada por marizistas de Sousa, em reforço ao pequeno núcleo do PMDB cajazeirense, na mais desequilibrada eleição após 1930. Iniciado o debate, o clima já muito tenso piorava com o destempero de Bosco Barreto a repetir agressões verbais dirigidas a Mariz, que revidava de dedo em riste, deixando a chaleira prestes a explodir.
E explodiu. Da posição privilegiada em que me encontrava, sentado ao lado de Mariz, vi com meus olhos dirigirem-se para a mesa onde estávamos quatro partidários de Bosco Barreto: João Soares, Toinho Eletricista, Chiquim de Moisés e João de Manezim. Se havia outros, não retive na lembrança. Vinham em atitude nada amistosa. João Soares empunhou uma perna de cadeira que acabara de quebrar e partiu para a agressão física. Mariz seria o alvo. A tragédia não se consumou porque Zerinho se interpôs, enquanto os correligionários de Mariz lhe davam proteção em meio ao tumulto generalizado. Guardo na memória um detalhe da cena: um murro aplicado por João de Manezim em autoridade importante do município de Sousa. Impossível esquecer.
João de Manezim e outros correligionários formavam na “turma de Bosco”, um cinturão espontâneo proteção a um líder político fisicamente muito frágil, como era Bosco Barreto. A partir daquele dia Bosco, bravateiro insuperável, propalava que Mariz não faria comício em Cajazeiras. Não havia clima nem Mariz teria coragem. João de Mnezim ficou marcado pela caravana sousense a tal ponto que, no dia do comício do PMDB na Praça Camilo de Holanda, (este é o segundo episódio que desejo narrar), já perto do seu final, dona Mabel, esposa de Mariz, me chama a um canto do palanque, aponta discretamente para um cidadão de cinto branco e pergunta:
– Cartaxo, aquele é João de Manezim?
Era ele mesmo. Ato contínuo, Mabel vai ao fundo do palanque. Resultado, em menos de três minutos, quatros “rapazes de confiança” do coronel José Sérgio Maia postaram-se em torno de João de Manezim. Nada aconteceu. Felizmente, tudo terminou em paz naquela noite de festa cívica para a minúscula oposição de Cajazeiras.
Tempos depois, em encontro João de Manezim, recordo o episódio e indago se ele notara a presença dos seguranças e do risco que correra.
– Mas hómi, e eu sou doido!
Disse e deu uma risada. Uma risada daquelas que ficam gravadas na memória de todos nós, para sempre.
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