O pomar de Tantino Cartaxo
Por Francisco Frassales Cartaxo – Na primeira semana do ano tiramos “férias” e fomos, Célia Maria e eu, passar uns dias em João Pessoa. Alugamos um flat no final da Avenida Cabo Branco, em trecho menos agitado pela invasão de turistas. De manhã cedo, antes de sentir a água salgada em nossos pés, uma surpresa: Rua Mirtes Bichara Sobreira, esquina com a Avenida. Que coincidência da peste! Mirtes, viúva de Ivan Bichara, primo de meu pai, está viva, com mais de cem anos, mora em Salvador há doze anos na companhia da filha Lavínia. Meu confrade da ACAL, Guilherme, neto de Ivan, criado quase como filho, esclareceu.
– O terreno onde foi construído o prédio era de vovô!
Está explicado, menos a coincidência…
A casa de Elita e Tantino é nossa referência maior em João Pessoa, onde desfruto da companhia do único irmão vivo, afora Nanza que, em Fortaleza, arrasta sua vida a caminho dos 100 anos! Desta vez, a mais agradável surpresa foi o próprio Tantino, que há poucos meses nos dava preocupação em virtude de crescente perda de mobilidade para a carga de seus 120 quilos e, em consequência, chegava a influenciar sua capacidade cognitiva. Agora o papo flui bem. Ajudado pelo aparelho auditivo, falamos de Deus e o mundo, ele empolgado com o seu pomar. Vaidoso, mostra cajueiros, pés de manga, cajarana e atemoia. Do lado da casa, no Condomínio Parque Verde, me deparo com ramas de jerimum e melão prestes a frutificar, pimenta de cheiro e malagueta, pés de tomate, de acerola, goiaba, mamão, coentro, cebolinha, manjericão. E mais, o coqueiro, touceiras de malva e cidreira.
Tantino levou Cajazeiras para junto dele!
Assim afoga a saudade. Nada melhor do que o olho do dono. No andador, ele cuida de aguar, tirar galhos secos. Você prefere qual dessas frutas? Caju, respondeu em cima da bucha, o olhar atento nos dois pés que dão frutos maduros de janeiro a dezembro. Eu sei a razão da preferência… falei com malícia na entonação. Ele confirmou.
– Não existe tira-gosto melhor.
Nos dias que lá estive, preferiu cerveja. Bebe com moderação. Fica na segunda, terceira long neck antes do almoço. Perdi 29 quilos! Aí está o segredo para a surpresa de encontrá-lo com disposição de viver, mesmo longe de Cajazeiras, mas reconstruindo numa nesga de terra o ambiente onde morou a vida toda. Só não dá para desfrutar a sombra inigualável do bicentenário pé de tamarindo ao lado da casa na Rua Barão do Rio Branco. De pé, na despedida, ele falou:
– Diga na ACAL que minha vaga ainda vai demorar!
Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.
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