Música e casamento
Os acordes de uma sanfona evocam os sons da infância embalada ao ritmo de Marinês, Trio Nordestino, os Três do Nordeste, Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro. Sons que chegavam pela voz chiada dos velhos rádios a pilha, estrategicamente localizados no ponto central da sala de entrada da casa, dividindo a importância com as imagens do Coração de Jesus e do Coração de Maria, já esmaecidos pelo tempo, nas molduras fincadas na parede.
A lembrança é instigada pelo forró contagiante e inteligente que Domingos e Os Quentes do Forró produzem com a simplicidade da gente desta terra. A sanfona alegre e afetuosamente dedilhada pelo Joabson, – a quem não conheço, mas cujo pai, o companheiro Geraldo Nascimento, dedico estima e apreço desde meus primeiros passos no jornalismo – ganha pujança e aquece o clima nas friorentas noites de julho. Os acordes da sanfona imitam os passos dos cavalheiros e damas no pavilhão de chão batido, frequentemente aguado e singelamente ornamentado com bandeirinhas de papel crepom.
Mesmo não sendo dançarina de forró, ou de qualquer outro ritmo, sinto a alma inebriada. E o contentamento cresce com a certeza de que qualidade, bom gosto, sensibilidade são sentimentos possíveis, e mesmo fáceis de serem praticados. Ouvir Domingos e Os Quentes do Forró ao vivo – já os escuto assiduamente através dos meios eletrônicos – alimenta a convicção de que existe vida inteligente na parafernália de sons e ritmos imitados e reproduzidos em série. Músicas de melodia medíocre e letras imbecilizantes e que, na lógica da indústria de consumo, são programadas nas estações de rádio e veiculadas como a única e possível opção. Nessa lógica previamente alinhavada as possibilidades inteligentes são segregadas e classificadas como invendáveis, ou mesmo, não comerciais.
Voltando ao cenário que motivou as lembranças musicais e o reconhecimento pela qualidade do trabalho produzido por Domingos e Os Quentes do Forró, me vejo numa festa de casamento onde uma lua minguante aparece fortuitamente no céu limpo e embaçado de frio. Nas mesas espalhadas em torno do pavilhão, conversas animadas, risos soltos. Crianças correm a desafiar a ordem estabelecida. Numa mesa, pamonha, bolo de milho, cocada. Nas paredes, peneiras de palhas e imagens de Santo Antonio e São João. No jantar, galinha de capoeira lembra o sabor de uma saudável e prazerosa degustação. O forró segue animado e ninguém cochila. O piso de chão batido é novamente aguado. Alguém cobra a cota. E os noivos, Alex e Walesca, sonham felicidade.
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