Acuda mãe… mãe me acuda
Por Francisco Frassales Cartaxo – O sol já brilhava quando um grito me levou do computador à varanda. A bicicleta parou em frente à casinha, o sofrido apelo bem perto, Me acuda mãe, mãe me acuda! O ciclista espiou pela fresta do portão, viu a mãe se aproximar do desespero do filho no jardim. Eu mal distinguia as pessoas, mas ouvia aquela repetição angustiosa: Me acuda mãe, mãe me acuda.
Impossível voltar às teclas.
Desci à portaria do prédio, onde encontrei o vigia, ainda na bicicleta, olhos esbugalhados, a narrar para o colega a inusitada cena. Ao me ver, foi logo dizendo, doutor, eu vi tudo, vi tudo pelas brechas do portão, doutor, quando a mãe saiu de dentro da casa, meu Deus, ela já bem perto do filho, ele só de calção, aperreado, querendo tapar com as mãos… como, como, doutor, eita porra era enorme!
Enorme o quê Dedé?
– O cacete do guri, oh, desse tamanho, duro feito pau-de-sebo!
Com um gesto, indicou a dimensão do pênis do menino, quase-rapaz. Aí a mãe foi muito mansa, falando baixinho, é assim mesmo filhinho, você está virando homem, é da natureza, isso não é doença, se preocupe não, sua mãe vai dar um jeito. Aí puxou ele para junto dela, abraçando como a gente faz com um bebê, foi arrastando devagar ele para dentro de casa. E ele repetindo, doutor, mas agora de mansinho, mãe, você me ajuda, você me acuda… e foi apertando a mãe, apertando, apertando, aí, eu não vi mais porque sumiram da minha vista, a porta quase fechada.
– Que porra é essa, doutor?
O garoto, tentei explicar aos dois vigias, vocês conhecem, tem problema mental, ele raciocina feito criança, é forte de físico e fraco da cabeça. Nessa idade é normal, mas ele não foi alertado para as mudanças do corpo, hoje acordou com uma baita ereção, espantou-se com sua antiga pitoca, agora um pênis entumecido… ora, ora, não vou falar, vocês sabem como é.
Volto ao computador.
Cadê a concentração? A ruminação, esse forte braço da memória, foi puxando restos de lembranças e, pouco a pouco, fiapos de frases me trouxeram um passado de 15 anos, mais ou menos. Veio à tona alto bate-boca entre um homem e uma mulher, de madrugada, no meio da rua. O pai da criança, que ia nascer, xingava a futura mãe por ter engravidado. Eis o motivo daquela briga, que chegou à agressão física na rua deserta. Minha memória recolheu esta frase gritada, o carro já sumindo: pois vá embora de uma vez, canalha!
De novo na varanda, vejo os dois andando, lentamente. O filho na frente, ela atrás, cabelos ainda molhados de quem acudiu o filho.
Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.
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