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Filhos terá uma expectativa de vida menor do que a dos seus pais por excesso de açúcar, sal e gordura

Pela primeira vez na história da humanidade a geração dos filhos terá uma expectativa de vida menor do que a dos seus pais e essa regressão se deve aos maus hábitos alimentares

Por Campelo Sousa

09/01/2018 às 08h55

Excesso de açúcar, sal e gordura tem deixado nossas crianças doentes

“Eu abro a felicidade”. A frase foi dita por uma criança quando se referia a uma lata de Coca Cola e foi para mim o trecho mais impactante do documentário ‘Muito Além do Peso’, dirigido por Estela Rener e Marcos Nisti. A obra é de 2012, mas segue muito atual e trata da presença dos produtos ultraprocessados na vida dos brasileirinhos e sobre os seus efeitos nocivos, sobretudo a obesidade. Eu recomendo que seja assistido por todos que tenham filhos pequenos. Voltei a vê-lo porque um dos dados que aparecem nele estão novamente circulando pela internet e causando desconforto. Não é para menos, uma pesquisa feita pela Unifesp na época revelou que mais da metade das crianças com menos de 1 ano já consumiam refrigerante no nosso País, não duvido que hoje este percentual já tenha até aumentado.

O assunto pode ser bem mais sério do que se imagina, pela primeira vez na história da humanidade a geração dos filhos terá uma expectativa de vida menor do que a dos seus pais e essa regressão se deve aos maus hábitos alimentares, sendo que o pior deles é certamente o consumo frequente de ultraprocessados. O refrigerante é apenas um entre tantos que estão presentes na rotina alimentar dos pequenos. Bolachas recheadas, salgadinhos, chocolates, balas, macarrão instantâneo, produtos compostos de muito açúcar, sal, gordura e aditivos químicos e sem nenhum nutriente, ou com quantidades ínfimas deles, cujo consumo frequente, ao lado do sedentarismo e da queda no contato com alimentos naturais têm causado nas crianças doenças e sintomas de adultos, como obesidade, trombose, artrite, colesterol alto, pressão alta, diabetes, depressão, problemas cardíacos, cansaço excessivo, peso nas pernas, dores articulares e falta de ar, entre tantos outros. Muitos pais acreditam que não devem se preocupar com o excesso de peso das crianças por ser uma questão ‘meramente estética’ e que deverá ser revertida com o tempo, porém a cada 5 crianças obesas, 4 serão adultos obesos. Ainda que se tratasse somente da aparência, com certeza os quilos a mais na balança já trazem questões muitos sérias de aceitação e de auto-estima para os que sofrem com eles.

Se muitos dos males mencionados acima estão ligados com o excesso de peso, pode parecer que não precisamos nos preocupar com o que as crianças magras vão comer e que podem comer o que quiserem, o que é um grande engano. Elas podem apenas gastar muita energia ou simplesmente não têm tendência a engordar, mas os efeitos nocivos dos ultraprocessados valem para todo mundo. Vou dar um exemplo. Tenho um filho de 4 anos e costumo levá-lo às festinhas dos amigos, no último aniversário foi nítido que as crianças ficaram muito mais agitadas depois de comerem os docinhos, foi uma gritaria geral, passaram a correr sem parar, de um lado para o outro, as brincadeiras mudaram completamente, começaram a lutar, a subir nos sofás, a chorar. Mas a minha preocupação está longe de ser comportamental, o meu incômodo não era com a bagunça nem com o barulho, mas com o efeito instantâneo do açúcar sobre o cérebro deles, que passa despercebido pelos pais. Mesmo aqueles que são mais tranquilos têm os cérebros afetados pelo excesso de açúcar, que pode prejudicar a aprendizagem, por exemplo. Os efeitos da ausência de micronutrientes na alimentação, como as vitaminas e os minerais dos alimentos naturais, e do excesso de macronutrientes, como os carboidratos, são tão diversos quanto são os nossos filhos, cada um reage de uma forma, mas todos serão afetados. Um efeito muito comum, por exemplo, é a queda no sistema imunológico, que deixa as crianças fragilizadas com qualquer mudança de temperatura.

“Não dá pra competir fruta com salgadinho, porque eles são muito mais gostosos”, a declaração feita por uma menina de 12 anos, entrevistada pelo documentário, parece refletir o que pensa a maioria dos brasileirinhos, que não fazem a menor ideia do que estão comparando. Não entendem e nem precisam entender tais diferenças, cabe aos pais buscarem informação para fazerem uma boa escolha por eles e, se for preciso, para fazerem algumas mudanças nos hábitos alimentares da casa, em prol da saúde dos pequenos. Se você quiser entrar nessa briga vale lembrar que o paladar de quem está acostumado com os realçadores de sabor dos ultraprocessados fica cada vez mais prejudicado e eles só passam a sentir os sabores mais fortes, aqueles com excesso de sal e açúcar, que não estão presentes nos alimentos naturais, portanto passam a rejeitá-los cada vez mais. Mas esse processo pode ser revertido, se forem afastados desses produtos, o paladar vai voltando ao normal e a aceitação da boa e velha comida de verdade tende a melhorar, assim como a saúde e a qualidade de vida deles.

Temos uma cultura alimentar muito arraigada, que relaciona profundamente a alegria das crianças ao consumo de açúcar. Com o poder de persuasão da propaganda feita pela indústria alimentícia e com a praticidade e a facilidade de acesso aos ultraprocessados, essa relação fica ainda mais próxima. Mas para mim, criança feliz é criança saudável e é muito possível oferecer experiências prazerosas e marcantes para eles sem que elas estejam regadas de açúcar.

Juliana Carreiro / Estadão

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