Saudades do compadre
Como nos despedimos dos compadres? Sobretudo, quando esta despedida vem marcada pelo inexorável, pelo imponderável e pelo definitivo? Nossa relação de compadrio não nasceu de nenhum ritual oficial, mas sim, da amizade que foi se constituindo nas conversas e nas historias contadas em encontros prazerosos e, nestes momentos, com seu jeito bonachão e afetuoso, me tratava de Comadre Bastiana. Isso, no início dos anos de 1980 quando iniciei minha atividade profissional em emissoras de rádio da cidade e o conheci como maestro do Coral São João de Deus.
O som contagiante de sua voz entoando a Ave Maria inebriava nossos corações. O seu jeito simples, mas sincero, de reger outras vozes que, em ocasiões diversas e por múltiplas motivações, cantavam músicas populares e sacras como a estreitar os laços com o majestoso e o mágico que somente o mundo da música consegue estabelecer, soava como um clima mágico.
Mais tarde convivemos mais proximamente como professores da Universidade, lotados no mesmo departamento e lecionando a mesma disciplina. Com todos sempre teve uma relação de afeto e amizade. O seu jeito brincalhão semeou apenas afeto. O seu lado amigo estava sempre disponível para um abraço de conforto, uma palavra de estímulo, um gesto de afago. Como advogado também marcou sua atuação pela postura ética e pela defesa da verdade e da justiça como medidas de construção de humanidade e como caminhos de fortalecimento de laços de confiança e crença nos homens de boa vontade.
Ele também foi um homem de fé. Acreditou e vivenciou os ensinamentos cristãos herdados dos pais, jamais hesitando em demonstrar suas convicções religiosas e anunciar sua fé em qualquer circunstância. Sua presença, por anos, na missa dos domingos pela manhã na Matriz de Nossa Senhora de Fátima era infalível e sua voz comentando o ritual litúrgico através das ondas da rádio o tornava conhecido em muitos lugares.
Durante algum tempo também participamos, como debatedores, uma vez por semana, de um programa de rádio, juntamente com outras pessoas. O debate de temas os mais diversos nos aproximava mesmo com a divergência de pontos de vista porque, acima de tudo, cultivávamos a tolerância e o respeito pelo diverso e pelo contraditório.
Assim, foi minha relação com o compadre João de Deus. Uma relação de amizade. A tradição reza que os compadres sejam como uma extensão da família. Assim, sempre me senti quando me encontrava com o compadre João de Deus. E com o mesmo sentimento familiar senti a dor de sua partida. A saudade de um amigo que, nos laços fraternos de compadre enviesado, sempre me fez sentir o valor da amizade e do gesto fraterno de sermos gente. E como a vida é fantástica, compadre João: tu partiste às vésperas do São João e hoje brilha no céu como um reluzente balão cantante.
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