Para Luiza e Nazaré
Vim estudar em Cajazeiras em 1971. Inicialmente, no final de 1970, vim fazer o Exame de Admissão para ingressar no Colégio Estadual. O único da rede pública da cidade. Neste ano foi a última vez que esse tipo de exame foi realizado como estágio de seleção para ingresso no então ginasial. Eu e uma irmã, Auxiliadora, que, dois anos mais velha, frequentava o mesmo nível escolar no sítio. Ela foi aprovada e eu, pensando apenas na vida livre e sem fronteiras de Impueiras, não me concentrei o suficiente e não obtive êxito. Voltar a freqüentar a escola de Dona Lourdinha, no Cipó, era complicado, por falta de companhia para percorrer os mais de quatro quilômetros que separava nossa casa da escola. Vim estudar em Cajazeiras. Consegui, com alguma dificuldade, pelo atraso do tempo, uma vaga na Escola Lica Dantas, onde frequentei a turma de Dona Cila Carneiro.
No final do ano de 1971, já um pouco adaptada a vida urbana, prestei o então exame de seleção e consegui uma vaga no Colégio Estadual. Fui cursar o primeiro ano ginasial. Porque resgatar essa história? Ela ressurge esta semana com a morte da professora Luiza Moisés. Não lembro qual disciplina ela me ensinou na primeira série, no Colégio Estadual. Mas me fascinava a sua inominável capacidade para o desenho. O tempo destruiu alguns desses desenhos que ela fez de traço livre em meu caderno. Mas em minha memória de menina aquele mundo de fantasia traçado com a firmeza do grafite me transportava para universos mágicos.
Mais tarde, como professora do Campus da Universidade Federal da Paraíba, em Cajazeiras, volta a me encontrar com Luiza Moisés. Agora não mais como aluna e mestra; mas colega de profissão. Ela lecionando Filosofia, uma de suas paixões. O desenho mantinha-se como uma de suas marcas pessoais. Como o desenho, seu jeito simples e sua enorme capacidade de amar o outro sem fronteiras ou ressalvas. Com esse desprendimento, ela ilustrou uma cartilha que lançamos, através do Núcleo de Estudos da Mulher Sertaneja (NEMS), sobre os direitos das mulheres na nova Constituição.
Também no Campus da UFPB em Cajazeiras voltei a me encontrar com Dona Nazaré Lopes que foi minha professora de Portuguesa na primeira série ginasial, no Colégio Estadual. Foi ela que, na época de colégio, atiçou o meu gosto pela leitura, que já havia sido instigado por meu pai, através da leitura dos versos de cordel, dos almanaques do Biotônico Fontoura e do Mensageiro do Coração de Jesus. Dona Nazaré me emprestou vários livros, como Papai Pernilongo, obras de Machado de Assis e José de Alencar. Livros que devorava com a necessidade de conhecer seus desfechos e de sonhar os mundos que eles sugeriam. Não sabia que esse gesto estava forjando minha capacidade para gostar de escrever e me estimular a seguir a carreira de jornalista. Queria apenas ocupar o tempo tomado pelas saudades de Impueiras e da vida sem peias que suas ladeiras e terreiros me oferecia. Mas um universo de magia e de aventuras me era apresentado nos desenhos rabiscados por Luiza Moises e nas páginas dos romances emprestados por Nazaré Lopes. E foram eles que me ajudaram a sufocar as saudades da casa paterna e a gostar de letras e imagens que nos dizem mais que meras palavras. Talvez seja tarde, mais nunca impossível, manifestar, de alguma forma, minha imensa gratidão a seus gestos de mestras.
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