O Rio continua lindo?
Por Francisco Frassales Cartaxo – Na saída do prédio onde estamos hospedados, o porteiro nos alertou “cuidado com o celular, só carregue uma bolsinha, assim colada ao corpo, escondida debaixo da blusa”, disse, fazendo o gesto, dirigindo-se à minha esposa, “o Rio anda muito violento”. Justo nessa hora, fui abordado por um pedinte com olhos e entonação de faminto… Aí o porteiro sussurrou “não pare, não dê nada, não puxe conversa… nunca se sabe, nunca se sabe”. Essa foi a primeira orientação recebida, ao sair do edifício na rua Hilário de Gouveia, cem metros da Avenida Atlântica, dois dias antes da queima dos fogos na praia.
Outras foram dadas no mesmo diapasão.
No dia anterior, ouvimos: “Neste período de festa santo nenhum nos protege”, lamentara o taxista no percurso Galeão-Copacabana. Célia Maria, aqui nascida, a recordar seus tempos de menina, dialoga com o motorista, já agora despido do formalismo profissional. Ouvido atento, eu me deslumbro com a variada paisagem natural de morros e serras, acariciados pelas nuvens. Que contraste com a presença do homem e sua nefasta agressão à natureza exposta no chocante fosso das desigualdades sociais! Moço, já passamos pela favela dos Macacos? Aquela ali, aponta ele.
Na subida do viaduto relembra o taxista.
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– Já fiquei preso nesta avenida, esperando o tiroteio acabar, todo mundo abaixado na mureta para evitar uma bala, senhora, sem a gente saber de que lado vem.
O lado geográfico ou lado do poder. O da Polícia ou o do crime organizado, de qual das facções entre muitas que formam o poder paralelo na República.
Dia seguinte fomos visitar o último tio vivo de Célia Maria, vindo do Rio Grande do Norte na década de 1950. Hoje com 92 anos, sua casa em antigo subúrbio carioca mais parece uma prisão. Toda cercada de grades, trancada de chaves.
Mandei instalar três câmeras de segurança, levantou-se para mostrar o local exato de cada uma, mesmo assim não durmo tranquilo! Vocês viram o posto de gasolina que foi incendiado ontem de madrugada? Aqui pertinho, os bandidos não acharam dinheiro no caixa e com raiva explodiram tudo.
Isso a dois dias do réveillon.
Não foi tão apavorante a passagem do ano. Rigoroso planejamento foi executado. Todas as ruas de acesso à Atlântica tinham revista individual para apreensão de qualquer instrumento usável para agredir: de armas de fogo a simples cabo de bandeira! As pessoas enchiam garrafas plásticas com bebidas, fazenda mais lenta as enormes filas. Veículos policiais, bombeiros, ambulância em pontos estratégicos ou circulando. Nos dois quilômetros que andei nada vi de agressão… Até parentes que nos alertaram, lá estavam com seus celulares documentando o réveillon de privilegiados foliões! Mas tem uma coisa: fedor na vizinhança dos mijadores móveis…
Mesmo assim, o Rio de Janeiro continua lindo!
Sócio da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
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