Mais que uma simples mulher
Por Maria do Carmo
É motivo de alegria afiar a linha do raciocínio e emocionante ao registrar o relato de uma importante mulher: exemplo de humildade e resiliência, uma deficiente visual saudável e satisfeita com seu gesto caritativo de amor ao próximo. Cícera Leandro de Farias nascida em 31 de Agosto de 1932, filha de João Francisco de Farias e Oreliana Maria da Conceição.
Dona Cícera é natural de Patos Espinharas, migrando-se da cidade de Sousa para o Sítio Bamburral no município de Cachoeira dos Índios aos 10 anos de idade. Outras localidades da zona rural de Cachoeira serviram de abrigo para a família de Cícera, entre elas o Sítio Coaçu e o Sítio Serrote do Quati onde residiu por mais de 12 anos. Atualmente mora na sua própria propriedade próxima a Cachoeira dos Índios: paraibana, sertaneja da gema.
A menina Cícera cresceu sem aprender a ler e escrever, uma vez que na época, as perspectivas para estudar eram muito difíceis para algumas famílias, no entanto ela muito destemida juntamente com seus pais, irmãos e irmãs enfrentavam a luta na lavoura em chãos cachoeirenses, no sistema de parcerias nos terrenos de proprietários ali residentes. Nesta época as jovens mulheres inclusive Cícera, tinha como principal objetivo casar-se constituir uma família e assim a mesma realizou uma única união conjugal com Lauredone Severino do Nascimento.
De uma frondosa árvore geneológica de 12 filhos, a mãe Cícera sofreu as dores do parto e a partida de 06 filhos para a eternidade: uns ainda recém nascidos e outros na idade adulta. A avó e bisavó Cícera, muito boa de memória, contabiliza mais de 50 netos e 15 bisnetos e neste ano de 2022, completa 90 anos de idade, uma trajetória de vida marcada pelas realizações e dificuldades, mas também com resistência aos desafios enfrentados nos percalços da vida.
Esta mulher alta de pele escura, cabelos longos e pretos, hoje se encontra num tom esbranquiçado pela tintura do tempo e das experiências de vida, é uma entusiasmada, frente às realidades, esperançosa e confiante na fé em Deus. Enquanto jovem dona de casa administrava as finanças do lar, ajudando o esposo no cultivo das grandes roças e a criação de animais e aves domésticas; o cantar do galo nas madrugadas, acordava todos para mais um dia que surgia; o mugir das vacas repercutiam os sons no Serrote do Quati sinalizando que ali, existia a residência de uma numerosa família trabalhadora.
Dona Cícera, uma católica que mantém a tradição religiosa realizando anualmente a “Renovação do Coração de Jesus”. Neste dia sua casa fica em festa, à noite vem muita gente rezar, cantar, louvor e aplaudir com os fervorosos “vivas ao Coração de Jesus”, assim como as novenas pelas das graças alcançadas nas promessas são celebradas com muito fervor. O nascimento dos filhos e o batizado dos mesmos eram motivo a ser festejado com uma boa recepção aos compadres e as comadres. Todos estes eventos realizados com muita dedicação, sem se falar boa culinária e a felicidade contagiante de Dona Cícera.
Hoje na terceira idade, Dona Cícera compartilha sua fé na missão de “rezadeira”; palavra da linguagem popular do nordeste atribuída à pessoa que reza nas outras que estão doentes. Assim diz a rezadeira Cícera: “rezo de mal olhado, carne triada, cobreiro, isipela, micose; rezo no rico e no pobre, faço a caridade com muita boa vontade, quem me paga é Deus e quando não há em quem rezar penso: as pessoas estão bem de saúde”. “Graças a Deus!” Sua residência é bastante visitada por muita gente: crianças, jovens e adultos vindos em busca da cura confiante na “reza” de dona Cícera, com o seu raminho verde faz orações libertando tanta gente da dor.
A anciã foi diagnosticada com glaucoma, na sua narração ela diz que “ver apenas um clarão”, no entanto é dotada de paciência, resignação e gratidão a Deus, superando sua deficiência e enxergando com os olhos da generosidade. Eis o mistério da felicidade! Por outro lado sua conversa é séria e realista, porém dependendo do assunto conclui com um largo sorriso. É a serenidade em pessoa. Dona Cícera recebe os parabéns de todos os filhos e filhas, familiares, amigos e amigas. Todos lhe desejando. Vida! Vida! Vida!
Professora Maria do Carmo de Santana
Cajazeiras, 29 de Agosto de 2022
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