Fonte hídrica e histórica cajazeirense ameaçada
Por Maria do Carmo
O Açude Grande de Cajazeiras tem na sua origem as raízes da criação do atual município e nos aspectos geográfico o processo de interiorização da Paraíba. As terras onde se encontram o açude foram doadas pelo sesmeiro pernambucano Luís Gomes de Albuquerque ao pai de Ana Francisca o qual presenteou sua filha em forma de dote por contrair matrimônio com Vital de Sousa Rolim, fundadores de Cajazeiras.
Em 1804 foi construída casa da fazenda e ao lado através da mão de obra braçal de escravos e transportados a terra nos lombos de animais um Açude de pequeno porte onde armazenava as águas trazidas pelos riachos da Caeira e Casimiro garantindo o suprimento da criação de gado e da fazenda Cajazeiras, mais tarde o Sítio Cajazeiras. O Açude Grande é uma marca histórica que permanece existindo mesmo com a precária preservação visto que a casa da fazenda foi demolida e em seu lugar construída o Cajazeiras Tênis Clube que de certa forma simboliza a antiga edificação.
A grande seca de 1915 castigava o Nordeste Brasileiro obrigando as autoridades constituídas no município de Cajazeiras a se mobilizarem no sentido de ofertar serviço aos flagelados da seca. Neste contexto triste de fome e pobreza foi iniciada a obra de reforma e ampliação do Açude no mês de Dezembro do ano de 1915 sendo a mesma inspecionada pela Inspetoria de Obras Contra a Seca, atual Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). Foi oficializada no dia 16 de Abril de 1916 a conclusão da reforma e ampliação do Açude denominado Senador Epitácio Pessoa, o popular Açude Grande, com uma projeção para comportar quase 2,6 milhões de metros cúbicos de água, conforme informações de artigo publicado na Revista Brasileira de Educação Ambiental.
As águas armazenadas no Açude Epitácio Pessoa auxiliaram no provimento do abastecimento de Cajazeiras até o início da década de 1960 (segundo fonte histórica) através do transporte em caminhões, caminhonetes (pipa) ou ainda ancoretas em lombo de animais e de carroças uma vez que pessoas vendiam este serviço. A partir do ano de1964 quando foi inaugurado o primeiro sistema adutor de abastecimento urbano vindo do reservatório de Engenheiro Ávido (Boqueirão) o Açude passou a ficar até certo ponto no esquecimento uma vez que apenas os moradores mais carentes da cidade de Cajazeiras: humildes donas de casa lavavam roupas às margens do açude e homens realizavam o trabalho de pesca tanto para o consumo como para a venda.
Paralelamente já acontecia o lançamento de esgoto nas águas do Açude Grande, fator de contaminação sendo constatados dois pontos no Bairro dos Remédios e um no Bairro Centro que junto canalizam águas pluviais e resíduos de outros bairros da cidade. Informações no artigo da Revista Brasileira de Educação Ambiental, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE, (2019), 54,8% dos domicílios do município de Cajazeiras estão classificados como possuidores de esgotamento adequado com efluentes tratados ou destinados às fossas sépticas, o restante dos esgotos 45,2% possuem destino desconhecido, o que podem está contaminando o solo e a água subterrânea e superficial inclusive do manancial histórico da cidade de Cajazeiras.
Atualmente, aparecem outros agravantes ameaçadores da sustentabilidade do Açude Epitácio Pessoa com o escoamento das águas do açude por baixo dos degraus que dão acesso à Praça João Pessoa e acontecendo o mesmo no calçadão da parede empossando no terreno baldio próximo à murada do antigo Colégio Diocesano Padre Rolim. Isto tanto causa prejuízo para o reservatório de águas como representa um grande perigo para a população residente próximo ao antigo Balde do Açude Grande. Uma grande parte dos terrenos pertencentes às margens e os terrenos de represas foram ocupados por construções impossibilitando o alargamento das águas do manancial que já está bastante aterrado. A concretização do balizamento está acontecendo, espera-se que não haja a prática do ato criminoso na ousadia de mais invasão do que resta do legado histórico.
O desconhecimento sobre a importância da preservação ambiental, a falta de conscientização sobre a ecologia e a ausência da visão a respeito dos valores histórico da cidade contribuíram negativamente nas políticas públicas das gestões do passado o que tornou o Açude Grande insignificante. Hoje, o Açude Senador Epitácio Pessoa é um patrimônio histórico localizado na zona urbana da cidade, reconhecido pelo Instituto Histórico Estadual visto com grande relevância para o ecossistema, as contribuições culturais, a beleza natural da cidade, o ambiente para o turismo, prática de esporte e lazer e um ambiente propício para as inspirações poéticas e higiene mental.
O Açude Grande já foi instrumento de projetos e manchetes sobre verbas encaminhadas para a construção do parque linear que ficou no imaginário; omissões e pouco caso sobre a magnitude da fonte de água cajazeirense e uma boa parte da população ainda permanece no comodismo e na ignorância sobre a preservação e resgate do patrimônio a que resguarda a história de um povo que viveu e vive nesta localidade. Por outro lado, há a organização de um grupo de cajazeirense através do Fórum Açude Grande Vivo visando a sensibilização da sociedade e da classe política na valorização e preservação do manancial. São movimentos articuladores e realização de eventos de cunho artístico e cultural visando conciliar o espaço histórico.
O Açude Grande fez mais um aniversário da sua reforma e ampliação, continua sendo um espetáculo natural, mesmo com suas águas fétidas;é um espelho que precisa ser mais respeitado e preservado, assim diz os poetas que admiram o encanto mas lamentam os descaso.
Professora Maria do Carmo de Santana
Cajazeiras, Abril de 2021
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