Ensinar como um ato de humanidade
O educador brasileiro Paulo Freire, conhecido mundialmente, que inspirou e inspira, desde meados do século XX, várias gerações, tem como uma de suas lições basilares a de que a educação é uma das possibilidades verdadeiras de humanização do homem. Essa humanização, como nos ensina o filósofo alemão Karl Marx, se faz no processo de transformação da natureza em cultura.
Ou seja, ao transformar uma pedra pontiaguda em machadinha, nossos antepassados mudaram suas vidas. Com a machadinha esticaram seus braços e alongaram suas mãos apanhando frutos e obtendo alimentos. Assim, antecipando-se a natureza.
Mas a machadinha de pedra também se transformou em lança, que feriu e matou. Lança que, alongando o braço de seus proprietários, encolheu seus despossuídos, suspendendo-os à condição de relegados.
A cultura, que transforma pedra em arma, conceitua e naturaliza posses, lanças, gêneros, categorias sociais, palácios, palafitas, como inerente a vida do homem por todo o sempre.
A história se perde nos desvãos das sagas de heróis e mitos que se alimentam da seiva da ignorância política que esconde, negligencia e embrutece a capacidade de pensar dos homens, sobretudo daqueles a quem as machadinhas e lanças segregaram e segregam.
Perde-se, por violento processo de extração a fórceps, a capacidade humana de humanizar-se.
De usar, de forma comum, a pedra convertida em lança, não para discriminar e agrupar de forma distinta, mas para reunir em torno da mesma condição, a de humanos que, pelo trabalho, transforma natureza em cultura, pressuposto que emerge como imperativo para o distanciamento do homem das outras espécies sobre a terra.
Buscando superar as dicotomias entre lanças de pedras e homens distintos, classificados entre senhores de armas e escravos animalescos, o curso da história traz para o cenário a educação onde, como nos ensina Paulo Freire, “o ato de ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”.
Desta forma, ensinar não pode ser restrito ao singelo e inócuo ato de transferência.
Mas, ação. Produção de saberes que atualizam vivências, permitem trocas e reciprocidades de experiências e de inserções em contextos diversos e distintos.
Ensinar, nessa compreensão, extrapola os limites da sala de aula. Pode ser expresso na música. Na arte cênica. No cultivo de plantas e na conservação da natureza. No amor e nas relações afetivas. No gesto do abraço e do braço que enlaça pessoas.
A educação que nos aproxima de outras dimensões quando os sons emergem de uma orquestra e, na simbiose de instrumentos, mãos e cérebros, alteram escalas, deslocam notas, ressignificam tons, enlevam o humano ao patamar do divino.
Enlevar-se na troca de lanças de pedras, armas atômicas, discriminação por prazeres de ser somente humanos. Nada mais.
E, assim, partilhar com Paulo Freire a convicção de que, “se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”.
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