header top bar

Fernando Caldeira

section content

E o Sertão como vai?

12/03/2009 às 07h49

Por: José Cícero
Aurora – Ceará.

Meio dia. Sol a pino. O calor a castigar a natureza das coisas contidas e sobreviventes neste mundão de meu Deus e que a ciência dos homens decidiu por algum motivo chamá-lo pelo nome esquisito de caatinga. Mata branca, mata cinza, mata virgem na língua vocabular dos nossos antigos indígenas. Mata. Floresta baixa. Raio da cilibrina. Linda paisagem quase alienígena para muitos. Uma estranha sensação indescritível que quase enlouquece de prazer ou alucina os verdadeiros alienígenas do além-fronteira que nunca na vida teve a sensação glorificante de se deparar com algo igual a panorâmica da nossa caatinga sertaneja com seus ventos frescos acariciando a nossa cara como se fosse uma declaração de amor pela vida inteira. O nosso sertão é isso, uma multidão de coisas belas postas sempre ao alcance das nossas mãos como dádivas de Deus oferecidas aos homens.

O sertão é sim, este mundo novo, diferente, carregado de belas metáforas e de silêncio contemplativo que a um só tempo, se misturam à tristeza assim como as alegrias de bichos ariscos, homens e plantas, solidão profunda em meio as rebanceiras. Garranchos, espinhos, lajedos, terra batida, cheiro de flor nativa, vôos rasantes de coisas aladas e pensamentos. Cantos de pássaros resistentes preenchendo todo o tempo e os dias do nosso sertão aurorense. Antologia poética escrita pelos deuses do Olimpo espalhada no chão por entre os riachos servindo de inspiração aos repentistas e aos poetas de uma vida cabocla e muito mais brejeira.

Meio dia. O sol está a pino. Em brasa tal qual os tachos quentes dos nossos antigos engenhos de rapadura sempre prontos a adoçar as nossas vidas.

A mata espinhenta nos toca forte à pêle parecendo querer beber nosso sangue com seus acúleos tênues como quem pede água aos céus através de nós. Ou quem sabe, beijando a nossa face deixando em troca, um pouco do perfume presente em cada ramo e em cada flor dispersas nas beiras dos caminhos.

Perfume nativo, saboroso quase afrodisíaco. Coisas do sertão, que só a natureza plástica da caatinga de Aurora e região, consegue evidenciar por meio das suas mais concretas e variáveis cores que como um organismo vivo, pulsa e respira forte assim como os bichos.
A nossa caatinga é vaidosa como a própria donzela sertaneja se enfeitando para os dias de festa. Bastando o roncar do trovão no alto da serra com os primeiros pingados de chuva para que ela se pinte de verde e se renove de carmim e, logo em seguida, todos os seus quadrantes se encham de abundante colorido a nos alegrar de amor e de prazer.

Este é o sertão. Um universo em particular onde o próprio tempo tem preguiça de passar. A vida é morosa e delicada em permanente comunhão com os homens e os bichos do seu chão. O bioma da nossa caatinga sertaneja é um espetáculo eterno encenado a céu aberto pelos anjos de Deus. Um quadro multicolorido, dos mais belos e valiosos pintado de todas as cores através do talento de Monet.
Mas, digamos que o Bioma da nossa caatinga, só existe no semi-árido nordestino. O mundo inteiro tem inveja deste presente dos céus. Sua fauna e sua flora são simplesmente surreais e não possui comparativo em nenhuma outra parte do planeta. Nem nas obras de Dali a caatinga d’Aurora e do Cariri pode encontrar comparativo.

O ambiente sertanejo é uma rara singularidade que a natureza inventou especialmente para nós os nordestinos do Brasil. Mais um grande motivo para que todos os contemporâneos comecem desde já, a se preocupar com as questões relacionadas a sua preservação. Além de se proporem a uma convivência mais racional baseada numa metodologia de sustentabilidade ecológica e humanista.
A sua vegetação assim como o seu relevo, também constituem um colorido à parte. Um palco perfeito para uma sifonia de pássaros. Tudo o mais que a caatinga possui é sui generis. Tudo nela nos convida à meditação num puro estado de espírito. Seja nas secas ou nas invernadas, a caatinga nos toca fundo com a sua paz infinita e a sua mancietude quase paradisíaca.

A caatinga nos toca a alma como quem tenta nos acordar do nosso sono mais profundo, quase letárgico. Mas não digamos por nossa passividade que tudo vai bem. Por que isso não é verdade. O nosso bioma está a correr perigo. Por isso nos pede socorro, como um mendigo a implorar por esmola e piedade, além da compreensão e da consciência dos homens.

O fantasma da extinção já começa a rondar dia e noite as matas do nosso sertão. A destruição por meio das queimadas, da derrubada e da extração ilegal da madeira começam a provocar grandes transtornos para a fauna e a flora do sertão. A poluição dos nossos mananciais, a erosão, a caça predatória e a desertificação são a um só tempo, as grandes mazelas que estão a sufocar intensamente a vida e a tranqüilidade ambiental da caatinga sertaneja. Somos todos responsáveis assim como vítimas em pontecial das agressões secularmente praticadas contra este ecossistema.

Com tristeza, constatamos que a cada dia é cada vez mais difícil se ouvir de novo e com freqüência como era comum no passado, coisas aparentemente simples como o canto do cancão, do galo campina, da juriti. Raro também é ainda hoje, avistar de novo o coloridos do pé de juá, do pau d’arco em flor, o cheiro do oiti, a festa das cores do Ipê, a produção da oiticica, a macunã, o sabiá de laranjeira, o peixe jutubarana, a abelha de canudo, o sanharol, o canto do três potes, o rato canoeiro, o camaleão a mudar de cor, o cágado jabuti, a rã de bananeira, o veado à beira d’água, o gato do mato maracajá, o sanhaço, o mangangá, o besouro rola-bosta, o lobo guará, o sonhim, a rasga mortalha, a coruja, a flor do bugari, a Aroeira, a timbaúba, o pau ferro, a batata de tiú, o cedro,o cipó de balaio, o cajuí, a castanhola, madeira nova, Algarobeira, pé de benjamim, papaconha, a raposa, o maracujá do mato, coco catolé, aveloz, algodão bravo, anum preto e cinza, mel de jandaira, pau ferro, araçá, oliveira, jatobá, cobra verde e de veado, galinha d’água, juriti, vim-vim, cigarra do meio dia, beija-flor de vários tipos, tirana bóia, pé de pequi, andu, mamão da terra, macaúba, pião roxo, borracha de maniçoba, abrir-fecha, bem-te-vi, camarão de água doce, piaba, corró, cari, marreco, casaco fedorento, mergulhão, mussum, rolinha fogo – pagou, angico, camaru, umburana, cordão de são Francisco, vassourinha, mastruz, quebra-pedra, imbu, pé de pitomba, oliveira, cabaça, araticum, jenipapeiro, melão de são Caetano, mané mago, esperança, soldadinho de chumbo, besouro de barro, Maribondo de chapéu, andorinhas lavadeiras, preá, gola preto e grigrilim.

Afinal, quem se arrisca a dizer quantas espécies nós já destruimos para sempre nos nossos sertões? Quantas ainda serão necessárias para que possamos acordar do nosso sono letárgico? Muitas destas espécies jamais poderão ser conhecidas pelos nossos filhos e, tampouco pelas novas gerações do presente e da posteridade.

Será que este é o mundo que queremos deixar para nossos filhos e netos? Penso que não. O que falta mesmo é a tomada de uma nova consciência ecológica, ante a responsabilidade coletiva em defesa da natureza e dos recursos naturais do planeta e da nossa caatinga.
Viva para sempre o sertão. Viva a caatinga da nossa Aurora , do Cariri e do Nordeste brasileiro.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Fernando Caldeira

Fernando Caldeira

Jornalista profissional em diversas emissoras de rádio e jornais da Paraíba, atualmente é articulista do Gazeta do Alto Piranhas (Cajazeiras), produtor e apresentador do programa Trem das Onze, apresentado aos domingos pela Rádio Alto Piranhas, colunista dos portais diariodosertão, politicapb, obeabadosertao, canalnoite, e mantém na internet o portal www.fernandocaldeira.com.br

Contato: [email protected]

Fernando Caldeira

Fernando Caldeira

Jornalista profissional em diversas emissoras de rádio e jornais da Paraíba, atualmente é articulista do Gazeta do Alto Piranhas (Cajazeiras), produtor e apresentador do programa Trem das Onze, apresentado aos domingos pela Rádio Alto Piranhas, colunista dos portais diariodosertão, politicapb, obeabadosertao, canalnoite, e mantém na internet o portal www.fernandocaldeira.com.br

Contato: [email protected]

Recomendado pelo Google: