header top bar

Padre Djacy

section content

Domingo: Dia de clássico no Higino Pires Ferreira

24/01/2011 às 10h18

Eduardo Pereira
Domingo a tarde em Cajazeiras é uma tarde… Como diria… Uma tarde… Uma tarde triste, digamos assim. Triste se você não tiver nada para fazer, se você não tiver nada para curtir. Mas isso não é só com Cajazeiras, para o bem da verdade. Isso é ruim para qualquer pessoa em qualquer cidade do Brasil. Ou do mundo. Mas quero me referir a uma tarde de domingo com um clássico de futebol. Um clássico de futebol em Cajazeiras? Sim, isso mesmo, Cajazeiras já foi palco de grandes clássicos do futebol paraibano.

Mas se há um clássico de futebol em Cajazeiras em um domingo à tarde, com seu Sol tradicional, com movimentação de gente próxima ao Estádio Higino Pires Ferreira, onde então reside a tristeza? Primeiro, a descoberta do tempo em que eu estou falando. Como se vê, me referi ao tempo do estádio de futebol no Higino Pires. Então isso ocorreu aí pelos meados da década de setenta, ou poderia ser a anterior.

E a tristeza era a de um guri, de um rapazola, que não podia ver o clássico paraibano Santos de Sérgio Davi x Sociedade Esportiva de Sousa. O Santos de Sérgio Davi: era assim que era conhecido. E esse era um clássico paraibano de pegar fogo, de conseqüências imprevisíveis de tanta paixão que os torcedores carregavam em si. E eu, esse guri, não estava presente a esse espetáculo porque, simplesmente, eu não tinha dinheiro para pagar o ingresso. Se bem que isso não era novidade. Geralmente eu conseguia entrar quando havia a deliberação de dirigentes permitindo o pagamento da entrada com cinco cascos de garrafa de cerveja, ou meus irmãos mais velhos descolavam uma entrada.

Todos meus amigos lá dentro do Higino e eu lá fora, gorejando pelas frestas do portão de saída um ângulo para captar algum lance do jogo. Azar meu. Mal dava para ver uma nesga do gramado, quiçá determinado lance. Mesmo que eu arregalasse os olhos o máximo que poderia ocorrer era meus olhos quererem coçar devido alguma corrente de ar penetrá-los. Mas aí ocorria a magia, a imaginação do guri, de qualquer guri interessado em mergulhar naquele espetáculo.

Como eu já tinha visto outras vezes esse clássico do sertão, já sabia as nuances da composição daquele cenário futebolístico, e não seria dessa vez que eu iria deixar de “vê-lo”. Quando eu ouvia um grito longo uníssono da torcida, em tom de “óóóó!!!!!”, eu já sabia que se tratava de um passe mágico dado por Perpétuo, do círculo central do campo, quando ele abria os braços para chutar e, previamente, com um olhar de ave de rapina, já tinha visto Biu Meu Fí lá quase se aproximando da zona direita de escanteio, e a bola chegava aos pés do ponteiro baixinho e veloz, redondinha, colada aos seus pés. Até parecia que Perpétuo tinha uma trena imaginária em seu cérebro que media a distância exata do percurso da bola até aos pés de seus companheiros. Era só Biu arremessar pra grande área e já vinha de frete Fuba, ou Blu, e dá uma cassetada de cabeça na bola para morrer dentro das redes. Essa é uma jogada clássica, é verdade, mas é preciso saber a hora do bote, é preciso ter a exatidão da bola esticada, e isso não era, não é, pra qualquer um.

A vibração demorada da torcida deixava claro para mim de que não se tratava apenas de uma pintura de Péto, e sim o seu complemento final. Era gol, o gol da glória dos que estavam lá dentro do estádio, e da minha que estava de fora também. Até esquecia eu de praguejar os felas que renunciaram os cascos de garrafas como ingresso.

Outro grito da torcida, mas sincopado, era indicativo de que tava rolando belas tabelinhas entre Péto, Blu e Fúba, que poderiam desencadear perigo de gol, e nesse momento – pra mim eu estava vendo – “seu” Sérgio Davi, à beira do gramado, dando chutes no ar, como se estivesse participando da jogada com seus “meninos”. Enquanto isso, ía eu e mais uma pá de guris ao portão de saída, e ficávamos como um cachorro fuçando um saco de lixo, doido pra ver se as frestas se abriam um pouco mais. Em vão. Voltávamos ao portão de entrada e esperávamos a “hora do miserável”, que era a hora de quando os portões eram liberados por volta dos trinta e cinco a quarenta minutos finais da peleja.

Entrávamos o mói, gritando, e a torcida nas arquibancadas também gritando de forma humilhante: – “vai, seus miseráveis!”. Mas a vergonha de guri passa longe da de adulto e eu estava no meu pleno direito de sem vergonha. Ainda dava pra ver Perpétuo e companhia, camisas suadas, suor correndo solto nas testas, ainda ali pelo meio do campo, como não quer nada, só na espera da tocaia de uma jogada final para dar o veredito da vitória mais do que declarada.

Também dava pra imaginar o que estava acontecendo durante o jogo, com a torcida, quando sempre tinha uns gaiatos escrotos que jogavam bagaço de laranja no côco de algum torcedor adversário, ou ficava aquela xingação ameaçadora dos cajazeirenses chamando os sousenses de côrno e os sousenses chamando os cajazeirenses de viado.

A cidade dos cornos e a dos viados era uma rixa de torcidas, como existia entre equipes São Paulo e Rio de Janeiro, Crato x Juazeiro (não sei realmente se lá existia essa rixa)…

Não dava para sair de meus ouvidos a narração de Zeito Trajano; não dava pra sair de minha cabeça a seriedade de Pedro Revoltoso apitando o jogo; não dava pra sair de minha mente o gramado cuidado, mesmo com as falhas aqui e acolá devido a comilança da grama pelo jumento de Aranha; não dava pra esquecer os gritos do pai de Biu com um sonoro “vai, Biu meu fie!”; Não dava para esquecer nada, mesmo eu não estando nas arquibancadas ou do outro lado que não tinha arquibancada – lugar dos que pagavam bem baratinho – e pegava o Sol de testa e por isso ficávamos com as mãos em meia concha fazendo de proteção.

Eu não esquecia nada, nadinha, porque ali, para mim, era o Estádio Higino Pires Ferreira, o nosso Maracanã.

BOLA DENTRO
Para a bela tradução feita por Eduardo Pereira quanto aos clássicos de futebol arte e mágico no Estádio Higino Pires Ferreira. Valeu Eduardo. NOTA 10!

BOLA FORA
Para a falta pelo menos por enquanto de uma perspectiva boa para o futebol profissional de Cajazeiras em 2011. Expectativas são sombrias. Será? NOTA 0!
 


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Padre Djacy

Padre Djacy

Pároco da paróquia Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, da cidade de Pedra Branca, no Vale do Piancó, Diocese de Cajazeiras, Paraíba.

Contato: [email protected]

Padre Djacy

Padre Djacy

Pároco da paróquia Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, da cidade de Pedra Branca, no Vale do Piancó, Diocese de Cajazeiras, Paraíba.

Contato: [email protected]

Recomendado pelo Google: