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Edivan Rodrigues

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Compra de voto e voto-cidadão

12/09/2010 às 18h03

Troca-se voto por crack, denunciou o juiz de Solânea. Traficantes, políticos e mototaxistas participam do negócio. A notícia correu mundo. E não foi inventada por um candidato qualquer no afã de tirar proveito eleitoral. A denúncia partiu do juiz Onesival dos Santos Costa, acrescentando que o fato já ocorrera no pleito de 2008. Se fosse no Rio de Janeiro, em áreas dominadas pelo crime organizado, não causaria tanto espanto, daí o destaque na mídia nacional dado à declaração daquela autoridade.

O voto virou mercadoria há muito tempo. Desde quando políticos espertos descobriram que podem aumentar o patrimônio pessoal, familiar e de amigos-laranja, usando mandato de prefeito, governador, deputado e senador. Na República Velha (1889-1930) era diferente: trocava-se proteção por apoio, o voto sendo apenas mero artifício legal de votantes fantasmas, de atas falsas escritas a bico de pena pelos espoletas dos coronéis. Era assim na peculiar formação política da época do coronelismo, que tinha na figura do coronel o núcleo local do sistema. Até aí, o dinheiro vivo ainda não entrava na barganha.

Pouco a pouco, todavia, após a revolução de 1930, sobretudo aí pelos anos 1950, o dinheiro vivo começou a incorporar-se à rotina do processo eleitoral. Conheci um deputado que criou fama de honesto, cumpridor da palavra, muito respeitado no mercado de compra e venda de votos. Por quê? Porque pagava aos intermediários as parcelas combinadas, antes e depois da apuração, religiosamente, desde, é claro, que os votos prometidos fossem computados. Nunca perdeu eleição, mesmo quando seu partido descia a ladeira. O deputado (foi ministro de Collor) conquistou fama de político sério. Ora, nunca fora sequer denunciado. Um ícone. Se vivo fosse, debocharia da “ficha limpa”.

Na cadeia do negócio do voto, há muitas formas de compra e venda. Troca-se voto por emprego público, por material de construção, receita médica, tratamento odontológico, conta de água, luz, telefone, remédio, passagens, enfim, tudo o que se imagine entra no bolo do negócio eleitoral. Isso tem uma lógica. Qual? A do benefício imediato. O voto para a maioria dos eleitores tem esse sentido. Um desvio democrático. Nada a ver com a cidadania conferida ao eleitor para exercê-la como instrumento capaz de influir na formulação e execução de políticas públicas.

Não pense o leitor que sou pessimista. Houve épocas piores, muito piores, quando sequer se podia votar. Hoje, vota-se com liberdade. Até para vender e comprar a mercadoria nas barbas de uma Justiça impotente para coibir esse tipo de tráfico. Infelizmente generalizado.
Um dia, porém, a gente aprende. A democracia é assim mesmo, dá trabalho. Custa mudar até chegar-se ao estágio superior do voto-cidadão. Agora, essa de trocar voto por crack, ah, meu caro leitor, é a cúmulo da degradação.
 

Edivan Rodrigues

Edivan Rodrigues

Juiz de Direito, Licenciado em Filosofia, Professor de Direito Eleitoral da FACISA, Secretário da Associação dos Magistrados da Paraíba – AMPB

Contato: [email protected]

Edivan Rodrigues

Edivan Rodrigues

Juiz de Direito, Licenciado em Filosofia, Professor de Direito Eleitoral da FACISA, Secretário da Associação dos Magistrados da Paraíba – AMPB

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