Cenas cotidianas IV
Uma notícia nos chega pelos veículos de comunicação. Um grande hospital de uma expressiva cidade de São Paulo deixa de atender aos pacientes, muitos dos quais percorrendo grandes distâncias e enfrentando graves problemas de saúde. A interrupção dos atendimentos traz uma explicação que, de tão imponderável, beira as franjas do irreal: um armário onde estavam armazenados prontuários médicos havia emperrado e os funcionários não conseguiam destravá-lo para que os médicos tivessem acesso as informações anteriores que caracterizam o quadro evolutivo dos pacientes.
Outra informação me chega através de uma pessoa amiga que trabalha em um órgão público na cidade de Cajazeiras. Diante das freqüentes fraudes de alguns servidores que, por artimanhas mil, burlam a prestação de serviço a população, usando de estratagemas como doenças imaginárias, assuntos pessoais de solução improrrogável, a chefia da instituição decide que todos os servidores devem comparecer ao trabalho. E, neste cenário, os episódios dantescos se anunciam. Pessoas com sérios problemas de saúde e clinicamente respaldadas em atestados médicos que comprovam incapacidades temporárias ou permanentes, são levados a subirem lances de escada, com o sacrifício da própria saúde, apenas para comprovar a assiduidade ao trabalho. Trabalho esse que se revela inócuo diante da impossibilidade de quem pretensamente o executa.
Emoldurada por uma paisagem natural deslumbrante que lhe rendeu o epíteto de Cidade Maravilhosa, o Rio de Janeiro convive, há décadas, com o poder paralelo que nasce da contravenção do jogo do bicho e se refina nas quadrilhas belicamente equipadas com os fartos e ilícitos recursos do tráfico de drogas. Acuada e assustada a cidade assiste, com recorrência, a manifestação desse poder paralelo através de variados e violentos episódios, como os contemporâneos arrastões que, assumindo o controle temporário de ruas e vias públicas, deixam um rastro de medo, destruição e morte. Espremidas entre o pânico individual e a morosidade do Estado em empreender ações concretas, permanentes e exitosas para combater essas quadrilhas, as pessoas comuns se recolhem em suas neuroses cotidianas, individualizando-se entre muros altos, cercas elétricas, circuitos de monitoramento e receios de sociabilidades.
Diante de tais fatos, quais comentários são possíveis ou oportunos? O que a sensibilidade e a sensatez humanas podem produzir de ponderações diante de situações que beiram o imponderável? Responda quem ousar de coragem!
Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.
Leia mais notícias no www.diariodosertao.com.br/colunistas, siga nas redes sociais: Facebook, Twitter, Instagram e veja nossos vídeos no Play Diário. Envie informações à Redação pelo WhatsApp (83) 99157-2802.
Deixe seu comentário