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Adjamilton Pereira

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As dobras da beleza

09/05/2013 às 21h57

As escassas chuvas caídas este ano em nossa região não foram suficientes para apagar a poeira de uma das mais dramáticas estiagens registradas nas últimas seis décadas.  No entanto, elas permitiram a reedição de um espetáculo que, sempre no mês de maio, acontece em nossa região semiárida. Andando nas estradas e rodovias é possível se inebriar com a profusão de cores e formas que espocam em moitas, ramagens e plantas rasteiras que se engalfinham entre galhos e troncos de juremas inanimados pela seca.

Como não ter a atenção atraída para as flores brancas, amarelas, lilases, verdes, azuis que abrigam as sementes e frutos de jitiranas, que perfumam arbustos e dão um tom de alvura a caatinga impregnada das flores esbranquiçadas das juremas. Como não se enternecer com o tapete amarelo que as malvas tecem nos descampados onde, semanas passadas, a terra estorricada expunha suas entranhas avermelhadas, ossudas e desnudas. Uma paisagem que nos remete ao sabor da infância quando, entre folguedos e risadas, sonhávamos elegância com as unhas improvisadas dos frutos do chifre de bode que, ainda hoje, formam elegantes e harmoniosas moitas no terreiro da cozinha de nossa casa em Impueiras. Como inventávamos esmaltes com a tintura das flores do rabo de rato e seu tom escarlate enquanto montávamos as festas das casas de bonecas animadas com os frutos do melão são caetano improvisados em galinhas assadas acompanhadas pela mistura de vinagre caseiro com água e sal, fazendo às vezes de bebida, reduzindo os estoques do condimento de mamãe que, sempre, nos repreendia com sua austera generosidade e carinho.

Mesmo com a inconstância dos períodos de estiagem, as chuvas fizeram brotar também os campos de alfazema braba que, ao sabor dos ventos brandos que anunciam as precipitações, espalham um agradável perfume pelo ar. Em muitos grotões e ribanceiras as melissas soltam seus pendões de flores coloridas e tremulam ao vento sua delicada folhagem que se encastela ao leve toque humano ao compasso da rima: melissa, teu pai morreu bem ali, tu foi a missa.Ao seu lado, partilhando o espaço e a beleza, os tufos rosas, vermelhos e lilases do capim mimoso que traça um enigmático e equilibrado balé rasteiro no ritmo do vento que espanta tristezas e os tons cinzas do verão

Infelizmente, as modernas técnicas agrícolas, com o uso de agrotóxicos e herbicidas, vêm ganhando, cada vez mais, espaço e adesão entre as nossas comunidades rurais. Práticas que destroem sementes, abortam a vegetação sazonal e enfeiam a paisagem com sua tonalidade monocromática, deixando mais triste e menos sedutora a paisagem do semiárido que, a revelia dos discursos negativos e pejorativos de feiúra e desidratação, revela uma beleza sutil e úmida em cantos, dobras e franjas escondidas aos olhos aligeirados e insensíveis ao belo.

Adjamilton Pereira

Adjamilton Pereira

Adjamilton Pereira é Jornalista e Advogado, natural de Cajazeiras, com passagens pelos Jornais O Norte e Correio da Paraíba, também com atuação marcante no rádio, onde por mais de cinco anos, apresentou o Programa Boca Quente, da Difusora Rádio Cajazeiras, além de ter exercido a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cajazeiras.

Contato: [email protected]

Adjamilton Pereira

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Adjamilton Pereira é Jornalista e Advogado, natural de Cajazeiras, com passagens pelos Jornais O Norte e Correio da Paraíba, também com atuação marcante no rádio, onde por mais de cinco anos, apresentou o Programa Boca Quente, da Difusora Rádio Cajazeiras, além de ter exercido a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cajazeiras.

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