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Cercados de regalias, presos desfurtam de álcool, drogas, churrasco, piscina, discoteca e até briga de galo em prisão

No presídio de San Antonio, venezuelanos e estrangeiros desfrutam de bebidas, drogas, piscina, discoteca e brigas de galo

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18/09/2011 às 11h17

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The New York Times

Prisioneiros e visitantes dançam na prisão de San Antonio, onde muitos desfilam com uísque e armamentos

Do lado de fora, a prisão de San Antonio, na Ilha Margarita, se parece com qualquer outra penitenciária venezuelana. Soldados em uniformes verdes cuidam de suas portas. Atiradores observam tudo de torres de vigia. Guardas lançam olhares ameaçadores aos visitantes antes de revistá-los na entrada.

Mas lá dentro, a prisão que hospeda mais de 2 mil venezuelanos e estrangeiros detidos principalmente por tráfico de drogas mais parece uma festa inspirada em Hugh Hefner do que um castigo para contrabandistas.

Mulheres visitantes circulam de biquíni sob o sol do Caribe, aproveitando uma piscina construída no seu pátio. O cheiro de maconha toma conta do ar. O reggaeton é escutado em uma boate cheia de casais. O logotipo da Playboy adorna as paredes do salão de bilhar. Os presos e seus convidados se acotovelam para apostar na barulhenta arena de briga de galos da prisão.

"Aqui são os prisioneiros da Venezuela que mandam, e isso torna a vida dentro da prisão um pouco mais fácil para todos nós", disse Fernando Acosta, 58 anos, um piloto mexicano preso no local desde 2007. Seu companheiro de cela, um empresário congolês, o havia sido contratado para pilotar um jato Gulfstream que os promotores afirmaram que seria usado para o contrabando de duas toneladas de cocaína para a África Ocidental.

Não é incomum que detentos armados exerçam um certo grau de autonomia nas penitenciárias da Venezuela. Presos com BlackBerrys e computadores portáteis organizam o tráfico de drogas, sequestros e assassinatos de suas celas, segundo a polícia, um legado de décadas de corrupção, superlotação e guardas insuficientes.

Mas a prisão de San Antonio, conhecida na Ilha Margarita como um lugar relativamente tranquilo, onde até mesmo os visitantes podem ir para uma festa no fim de semana, é a única na sua categoria.

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Filhos de detentos de San Antonio brincam em piscina da prisão durante tempo de visita

A própria ilha é um ponto de partida para carregamentos de drogas com destino ao Caribe e Estados Unidos, e os traficantes presos aqui muitas vezes acabam nesta prisão, efetivamente fiscalizando a vida detrás das suas paredes com uma mistura surreal de hedonismo e vigor. Alguns detentos caminham pelo presídio segurando rifles.

"Eu estive no Exército por 10 anos, portanto brinquei com armas a minha vida toda", disse Paul Makin, 33 anos, um britânico preso aqui em Porlamar por contrabando de cocaína em 2009. "Mas eu vi algumas armas aqui que nunca vi antes. AK-47, AR-15, M-16, Magnums, Colts, Uzis, Ingrams. Você pode escolher o que quiser aqui”.

Privilégios

Os presos dizem que devem seus privilégios incomuns a um companheiro de prisão, Teófilo Rodrigues, 40 anos, um traficante condenado que controla o arsenal que surpreende Makin. Rodriguez é o principal líder dos detentos – um pran, como são chamados os líderes dos presos.

Rodriguez também atende pelo apelido de El Conejo (o coelho), o que explica a proliferação da sua marca pelas paredes da prisão: o logotipo da Playboy.

No interior, há muitas oportunidades para que os detentos ganhem dinheiro. Os visitantes da ilha, um paraíso de palmeiras geralmente usado para férias, fazem filas nos finais de semana para fazer apostas na arena de briga de galos da prisão, gerando receitas de jogo.

Outros visitantes, cientes de que os guardas fazem na entrada mas não na saída, vão ao local para comprar drogas. Presos e visitantes fazem uso de um beco entre as celas para fumar maconha e crack.

Governo

O governo da Venezuela reconhece os problemas dentro de suas prisões, onde a luta entre gangues controladas por prans como Rodriguez contribui para um elevado número de assassinatos. Pesquisadores de direitos humanos descobriram que 476 presos – cerca de 1% da população carcerária de 44.520 de todo o país – foram mortos só no ano passado.

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The New York Times

Jesus Guevara recebe visita da namorada Claudia Brito na prisão de San Antonio em Porlamar, na Ilha Margarita

Na esperança de combater a violência, a superlotação e outras questões sistêmicas, o governo prometeu em 2006 gastar US$ 1 bilhão para "humanizar" as prisões. O presidente venezuelano, Hugo Chávez, mencionou a prisão de San Antonio em seu programa de televisão de domingo em dezembro de 2009 para que recebesse atenção especial, comemorando a construção de um anexo de 54 unidades para mulheres no local.

Mas grupos de direitos humanos dizem que a corrupção e desorganização institucional têm frustrado os esforços para melhorar as condições em muitas prisões do país. O Instituto de Estudos Penitenciários da Venezuela teve cerca de 1 mil graduados desde os anos 90, mas menos do que 30 deles trabalham nas prisões, privando o sistema de orientação profissional especializada.

Uma série de rebeliões nas últimas semanas têm ressaltado as dificuldades. Em abril, os presos de uma penitenciária perto de Caracas fizeram 22 reféns, incluindo o diretor, em protesto contra um surto de tuberculose. O impasse terminou depois de uma semana, quando as autoridades concordaram em substituir o diretor. Em maio, os presos em outra prisão fizeram seu diretor e 14 funcionários reféns por 24 horas para protestar contra o que chamaram de maus-tratos.

"O Estado perdeu o controle das prisões na Venezuela", afirmou Carlos Nieto, diretor do grupo Janela da Liberdade, que documenta violações de direitos humanos nas prisões venezuelanas.

Luis Gutierrez, o diretor de San Antonio, se recusou a comentar a penitenciária que controla apenas no título.

Resort

Nos finais de semana, o ambiente no seu interior, repleto de cônjuges, parceiros românticos e algumas pessoas simplesmente em busca de diversão, quase se assemelha a um dos resort de suas praias.

Os presos fazem churrasco à beira da piscina enquanto saboreiam uísque. Em algumas celas, equipadas com ar-condicionado e antenas parabólicas transmitindo canais da DirecTV, os presos relaxam com suas esposas ou namoradas. (A Venezuela, como outros países latino-americanos, permite visitas conjugais.) Os filhos de alguns presos nadam em uma das quarto piscinas da penitenciária.

Os presos se vangloriam de terem construído essas regalias sozinhos, com seu próprio dinheiro. E, enquanto San Antonio dificilmente pode ser considerada um local seguro – um ataque com granadas na enfermaria matou sete no ano passado – os presos alegam que, em comparação com outras prisões venezuelanas, muitas vezes prevalece a paz.

"A nossa prisão é uma instituição modelo", disse Ivan Penalver, 33 anos, um assassino condenado que prega na igreja evangélica da prisão.

O chefe dos presos, Rodriguez, entrevistado enquanto seus guarda-costas abriam ostras para ele, atribui essas distinções ao seu governo. Um mural na prisão retrata Rodrigues como o condutor de um trem, acompanhado de subordinados armados, seguindo em direção a um dedo-duro pendurado em uma corda.

"Há mais segurança aqui do que na rua", disse Rodriguez, um homem de pescoço grosso e condenação longa que ladra ordens em um celular. Perguntado sobre suas ambições após a prisão, ele disse que iria considerar a política. "Não é para me tornar presidente, porque isso seria longe demais", disse. "Talvez prefeito”.

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The New York Times

Prisioneiros fazem rosquinhas na prisão de San Antonio, em Porlamar, Ilha Margarita, no Caribe venezuelano

Até lá, a vida sob o seu comando segue seu próprio código. As festas incluem grupos de rap convidados a tocar no interior. Embora separadas por um muro, as 130 presas do anexo das mulheres misturam-se livremente com os prisioneiros do sexo masculino. Algumas formam ligações românticas, vivendo juntos, como fariam fora da prisão.

Em partes da prisão, algo que se aproxima da normalidade chega a prevalecer. Um prisioneiro com uma câmera e um laptop serve como fotógrafo, tirando fotos de colegas de cela e usando o Photoshop para fazer montagens, como uma em que são vistos encostados em um Hummer. Um barbeiro corta o cabelo. Uma barraquinha batizada de McLandro vende sanduíches. A boate toca reggaeton dia e noite. Galos saúdam a madrugada.

"Eu acho difícil explicar como é a vida aqui", disse Nadezhda Klinaeva, 32 anos, uma russa que cumpre pena por tráfico de drogas feminino. "Esse é o lugar mais estranho em que já estive". 

IG

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