Um Homem Novo
O povo, em suas manifestações religiosas, nos impressiona por sua simplicidade. Domingo passado tive a oportunidade de visitar o santuário franciscano mais freqüentado das Américas e o segundo no mundo inteiro, depois de Assis, na Itália, a Basílica de São Francisco das Chagas, em Canindé, com minha irmã, Rogéria, que me deu a grande alegria de passar o final de semana comigo.
Bastante conhecido de todos nós, sertanejos, pelas romarias e peregrinações desde 1755, quando a devoção a São Francisco foi instalada pelos capuchinhos no sertão sofrido do Ceará, Canindé tem uma aura divina que toca aos que se colocam numa real postura de oração e crescimento da fé.
Durante a concelebração da missa das 16h30m, gente do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba (havia pessoas de Sousa), Pernambuco e Bahia estavam presentes, em caravanas que, na Basílica, não conseguiam disfarçar uma alegria exuberante, a fazer da Igreja e todos os seus recantos um pedacinho de suas casas, porque sabiam estar na casa de Deus. Durante a homilia, o presidente da celebração, um frade italiano, falou da alegria que a expectativa do nascimento do menino Jesus gera naquele que tem fé. E pediu-me que, ao final, dirigisse algumas palavras às cerca de 500 pessoas que participavam da missa. Em brevíssimas palavras, disse ao povo que a alegria desta espera, tão bem lembrada pelo frade, não pode ser senão fruto da verdadeira conversão, da mudança de vida como requer o tempo do advento e a contemplação do majestoso pequenino na manjedoura.
Fenômeno singular que pode ser estudado de diversos pontos de vista (sociológico, antropológico, psicológico, filosófico), sem dúvida alguma, é sob o prisma teológico que se deve analisar a realidade das romarias. Seria algum tipo de fanatismo a causa de tanta gente sair de suas casas e enfrentar longas distâncias em “paus-de-arara” para “estar em Canindé”? Certamente não. De origens bíblicas e com base na tradição bimilenar da Santa Igreja, as romarias tornam atuais as viagens que pessoas, ao longos dos milênios, realizavam, às vezes à custa de muito sacrifício, para “ir à casa de Deus, e encontrar-se no limiar do seu Templo”. Desta forma, Compostela, Assis, Fátima, Lourdes, Aparecida, Canindé e tantos outros lugares da “manifestação de Deus”.
Assim fizeram os judeus, assim fazem os muçulmanos – que têm a obrigação de ir a Meca pelo menos uma vez na vida – assim fazemos nós, que nos sentimos bem em estar num lugar escolhido pelo próprio Deus, para encontrar-se conosco. São os santuários lugar de encontro com a divindade que “marca um encontro” com o homem que, por sua vez, O busca com o coração alegre.
Como que num oásis religioso em meio a tanta secura humana, o peregrino sente-se em paz e saciado com o alimento sagrado da Palavra de Deus e da Santíssima Eucaristia, confortado pelo perdão advindo da confissão sacramental, disposto e renovado a voltar para a sua labuta e enfrentar com mais coragem a realidade tão dura. E, depois desta “renovação” que só Deus pode fazer, não mais abatido “pelo cansaço e pelo calor”, temos um homem novo revigorado em suas energias e capaz de enxergar a Deus no outro, particularmente no que sofre.
Alegria e conversão foram as palavras que ecoaram em Canindé neste último domingo. O caminho de volta para Quixadá, ao lado de Rogéria, nem foi percebido por conta da conversa em torno de, imaginem, metafísica. O absoluto de Deus frente ao quase nada da criação. Segurança somente nEle.
A Rogéria, peregrina comigo em Canindé, minha gratidão pela tão valiosa visita.
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