Um clique para a arte
Por Mariana Moreira
O olhar sensível e educado consegue enxergar a vida pelas lentes e focos das câmeras que manuseia para além de cliques e imagens. Lugares e espaços da cidade revelados por outra dimensão mostrando passados vivos e esquecidos em frontais de casarões e beirais de casas modestas. Rostos singelos e expressões comuns de gentes que transitam ou vivem em ruas, praças, esquecimentos sociais ganham beleza na pujança da imagem que revela e esconde dramas e dores de uma realidade que exclui e esconde. Ontens e hojes no mesmo enquadramento de personagens e cenários capturados por olhos talhados de arte e afeto para enxergar o detalhe, traduzir o silencio, silenciar murmúrios e sons, que apenas se somam a uma fotografia.
Assim nos acostumamos a ver o trabalho do fotógrafo cajazeirense José Cavalcante Júnior, mas que a intimidade da cidade o rebatizou apenas e afetuosamente Cavalcante Fotógrafo. Em várias exposições já realizadas ele traduz em imagens e recortes toda a sensibilidade do olhar que enxerga além da retina.
Mas, agora, ele nos surpreende com uma exposição sobre a história dos cem anos da fotografia em Cajazeiras. Em um minucioso e cuidadoso trabalho de pesquisa Cavalcante Fotógrafo resgata imagens, biografias, equipamentos e câmeras, fotos e perfis daqueles que, neste percurso histórico, foram registrando a vida da cidade e da região. Um registro que traz momentos de emoção com a identificação de cenários, com o reconhecimento de pessoas, com o rememorar de fatos e ocorridos, com o recordar de lembranças que se fazem vida e viva.
Ali encontramos Nogueirinha e Chiquitita cobrindo os eventos sociais requintados da cidade em suas celebrações de bodas, batizados, aniversários, e nas festas de debutantes onde as “sinhazinhas” se mostravam para a vida adulta. Mas ali também estão outros tantos que, usando a fotografia e seu fascínio como ferramenta de sonhos e memórias, vão registrando o cotidiano da cidade em suas variadas nuances.
E como me encantei e me emocionei com o relato do Cavalcante Fotógrafo sobre as peripécias de seu pai, também fotógrafo, e um dos que estão presentes na exposição. Ele relata que o pai, ao observar e se inteirar da montagem e funcionamento das câmeras sacos, aquelas usadas pelos famosos lambe lambe, passa a fabrica-las e também promover cursos de fotografia. O estúdio, sua própria residência. Os alunos pessoas simples, comuns, gente da roça e da cidade que, além das aulas, muitos ainda gozavam da hospitalidade do mestre durante o curso, que durava entre um e dois meses.
A exposição do Cavalcante Fotógrafo, portanto, não é apenas um amontoado de imagens e utensílios antigos. Mas história, que pulsa e vive como a repetir os versos do poeta: (…) abrir o ângulo, fechar o foco sobre a vida. Transcender pela lente do amor. Sair do cético, entrar num beco sem saída. Transcender, pela lente do amor do amor. (Lente do Amor – Gilberto Gil)
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