Saudade de minha mãe
Por Francisco Frassales Cartaxo
A saudade se agarrou à alma com cola da infância. Melancolia sem fim. Impossível catar palavras, por mais que as procure, para desaferrar do peito essa difusa sombra. Como nuvens, cenas embaçadas do passado embolam-se cá dentro, sem me permitir selecionar uma sequer para desaninhar a dor da alma. Aos poucos, no entanto, começam a esvoaçar palavras soltas e emergir a imagem de um vulto e uma voz. Um velho em passos miúdos, num terraço, para lá e para cá. Indo e voltando, a lembrança aclara na cena fugidia o andar cadenciado, a voz. A voz recitativa do velho: Como a ave que volta ao ninho antigo,/Depois de longo e tenebrosos inverno…
Meu pai!
Agora é tudo luz. Corro a pesquisar e logo encontro o poema completo, Visita à casa paterna, de Guimarães Júnior. Meu Deus! O banzo busca saída. Luís Caetano Pereira Guimarães Júnior (Rio, 1845-1898, Lisboa) foi homem de letras com inteligência fincada nas ciências jurídicas e sociais, andante na diplomacia brasileira mundo afora. Navegou no romance, em peças teatrais e crônicas. Na poesia foi precursor de famosos como Olavo Bilac, Alberto de Oliveira, Raimundo Correia. Fundador da Academia Brasileira de Letras, cujo patrono da cadeira 31 é o poeta, jornalista, político, Pedro Luiz Pereira de Sousa. Hoje, Merval Pereira a ocupa…
E mais foi revelado.
Clóvis Beviláqua, na sempre consultada História da Faculdade de Direito do Recife, informa que Guimarães Júnior, vindo da Faculdade de São Paulo, chegou ao Recife, onde se formou (1869), pelo tempo da grande efervescência literária desse período. E o coloca entre os entusiastas do Recife, Tobias, Castro Alves, Palhares, Carvalhal, Plínio de Lima, que criaram a Escola Condoreira, segundo a qualificou Capistrano de Abreu, com o consenso de todos. Era a primeira fase da Escola do Recife.
E o soneto?
Visita à casa paterna
Como a ave que volta ao ninho antigo,/Depois de longo e tenebroso inverno,/Eu quis também rever o lar paterno,/Meu primeiro e virginal abrigo:
Entrei. Um gênio carinhos e amigo,/O fantasma talvez do amor materno,/Tomou-me as mãos, – olhou-me, – grave e terno,/E, passo a passo, caminhou comigo.
Era esta a sala… (Oh! Se me lembro! E quanto!)/Em que da luz noturna à claridade,/Minhas irmãs e minha mãe… o pranto
Jorrou-me em ondas… Resistir quem há-de?/Uma ilusão gemia em cada canto,/Chorava em cada canto um saudade.
P S – O soneto é oferecido A minha irmã Isabel. Que coincidência, o nome de minha mãe!
Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
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