Natal sem manjedoura
Por Francisco Frassales Cartaxo – Invadem tudo. A mídia tradicional, desde serviços de alto-falantes às televisões nacionais, e as redes sociais entre amigos ou para milhões de anônimos espalham repetitivas mensagens de Feliz Natal e Próspero Ano Novo. Algumas com ilustrações criativas, outras bizarras, e profusão de palavras sem eco. Diante delas, surge aplauso, riso, desconfiança, bocejo, revolta. Mas pintou buliçosa reflexão: cadê a essência do Natal? Cristão de meia tigela, usei lupa num dia de enfado. Aí me deparei com este
“ESPANTOSO PARA MIM. Revi as mensagens recebidas nos dois últimos dias. Nenhuma, mesmo de padres ou grupos religiosos, traz o Menino Jesus ou o Presépio, ou mensagem expressamente natalina”.
Quem escreveu?
Monsenhor Gervásio Fernandes de Queiroga. Aquele menino nascido no mesmo chão sertanejo da Paraíba, onde também brotou a deputada federal Luiza Erundina. Uiraúna, que em 1934 se chamava Belém, depois Canaã. (Tacapeste… sinal do Céu?). De lá saiu menino carregando a feiura física e uma carga de doenças pelos caminhos da fé em busca do saber. No Seminário Menor, em João Pessoa, virou presbítero. Em períodos diferentes cursou o mestrado em Filosofia e Teologia, o doutorado em Direito Canônico na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. E ainda fez licenciatura em Ciências Jurídicas na UFPB. Como sacerdote serviu nas dioceses de Cajazeiras e Patos. Professor universitário em Faculdades no Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. Durante mais de 20 anos foi consultor jurídico-canônico da CNBB, após publicada a tese doutoral CNBB, comunhão e corresponsabilidade. Nada disso o fez inchar o peito. Gervásio preferiu viver no meio de sua gente.
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Aqui e acolá, uma polêmica.
Padre Gervásio não arreda de suas convicções, daí a veemência acalorada. Atravessou períodos de enorme efervescência interna na Igreja. Embora não tendo a sorte de conviver de perto com ele, sei de suas prolongadas conversas com gente que pensa diferente, com ateus. E também da convivência, mutuamente proveitosa, com dom Zacarias Rolim de Moura, bispo de Cajazeiras, discreto prelado da ala conservadora da Igreja. Dom Zacarias o levou para o famoso Concílio Vaticano II, marcado por choques de visões opostas acerca do presente e do futuro da Igreja frente ao desafio de adaptá-la a um mundo em rápida mutação.
Gervásio vivenciou de perto tudo isso.
As ferramentas acadêmicas, aliada à experiência do Concílio muito lhe serviram. Mais do que usá-las em sala de aula ou para assessorar a CNBB, Gervásio nunca se despregou de suas raízes de sertanejo humilde. Ensinamentos lhe vieram da convivência com jovens e trabalhadores rurais na agitada fase antes do golpe de 1964 e na ditadura militar.
Mais tarde criou o Instituto Jesus Missionário dos Pobres, nascido de sua tenacidade, a partir do embrionário Projeto Missionário de evangelização libertadora dos pobres.
– Então Gervásio é um santo?
E eu sei?! Com 90 anos, ainda buliçoso, tem momentos de fraqueza, dúvidas, tristeza… Mais, não arrisco. Especulação é com o leitor, que pode ser atraído pelo sugestivo título do livro A tristeza de não ser santo: memórias do Pe. Gervásio Fernandes de Queiroga – livro-entrevista.
Sócio do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano
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