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Mariana Moreira

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Invenções pandêmicas

05/10/2020 às 09h02

Coluna de Mariana Moreira

Tempos pandêmicos e suas invenções. E assim, vamos assistindo as novas formas, modalidades e situações sociais que se improvisam e se instituem no afã desejo de transparecer normal o que traz, em sua manifestação, o mais visceral sentido revolucionário e convulsivo. Em sua dimensão planetária o vírus revira práticas, costumes, ofícios, lugares, mentalidades, teorias e visões de mundo. E sugere a invenção de outras maneiras de se mostrar no cenário de medos e incertezas.

A invenção mais recorrente destes tempos pandêmicos é o uso de máscaras. Apetrecho indicado por autoridades médicas como o mais eficaz engenho de prevenção à propagação do letal vírus ela vai se incorporando ao cotidiano com as peculiaridades de cada usuário. Assim, a garota descolada ostenta a mascara rosa choque, em formato de coração e com aberrantes letras que anunciam, no estrangeirismo bem aceito cá por essas bandas, “I love yuo”. O destinatário de tão enfática mensagem é o de somenos importância. Vale a paisagem.

Outros prendem a máscara no pescoço como se a terra estivesse sendo assolada por uma pandemia de caxumba. E saem faceiros com as fuças expostas a tudo, inclusive ao invisível vírus. E cresce os números de contaminados. E a morte ronda cada vez mais próxima de cada um de nós. “Ora, tirei a máscara apenas um instante. Afinal, isso incomoda”. Desculpas vãs, mas com desastrosas consequências.

Um amigo, em sua inesgotável capacidade de ironizar, me apresenta uma engraçada versão para o uso da máscara. “Sempre que coloco a máscara me dá uma vontade doida de ir assaltar uma agência bancária”. Ironias a parte, a certeza é que a necessidade de uso da máscara é inquestionável, embora, culturalmente, por ser um artefato da produção humana, vai ganhando contornos e desenhos os mais diversos no curso da própria diversidade que marca a presença humana neste planeta.

Outra invenção que chega na esteira da pandemia são as aulas virtuais. A revelia da precarização que esta modalidade está revelando, com a disparidade que caracteriza a vida de docentes e alunos em relação às tecnologias, o acesso a plataformas digitais, a formação, a desmotivação por uma improvisação tocada como se acabar o mundo fosse, o ensino remoto também produz suas interpretações irônicas e satíricas. Um colega de docência expressa o sentimento que lhe invade sempre que abre uma sala de aula virtual. Para ele é como se percorresse um cemitério com os rostos inertes e os nomes grafados em lápides, sem vida, sem movimento, sem expressão que indicie a presença pulsante da vida.

E assim, esses tempos pandêmicos vão reinventando a vida e, como nos ensina Gabriel Garcia Marquez, mesmo passando pela morte vamos retornando a vida por não suportar a solidão.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

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