Aldeia global
As muitas faces da vida se revelam em momentos os mais inusitados. Mais, no turbilhão de nossos cotidianos apressados, negligenciamos um gesto de afeto displicentemente manifesto e expressando calor humano que, sem nenhuma prescrição científica, provoca uma revolução de conceitos e concepções.
Assim, no cotidiano de nossos gestos e atos, não nos apercebemos como nos distanciamos de atitudes simples e verdadeiramente humanas como o gesto do bom dia, o abraço caloroso, o sentar ao lado e tocar o ombro quando o peso do mundo parece envergar nossas resistências. Encapsulamos-nos em nossos casulos de segurança, nos encastelamos em nossos reinos privados de torres, muros, vigias eletrônicos. Mergulhados no mundo maravilhoso e fantasioso da tecnologia e da ilusão e, neste mundo de irrealidades, idealizamos afetos, virtualizamos carinhos e, vergonhosamente, atrofiamos o simples aperto de mão, o leve afago de amizade.
Nesse cenário, ainda temos, morando em pequenas cidades, o privilégio de conhecer nosso vizinho, saber seu nome, partilhar sua vida. Ainda temos a prerrogativa de abrir a janela e vislumbrar o céu que, maravilhosamente, se escancara ante nossos olhos na amplitude da imensidão azul revelada pela beleza de agosto. Ainda somos sensíveis ao cão que, perambulando pelas ruas, nos mendiga um pouco de comida.
Ainda nos deliciamos com a simplicidade do bem-te-vi que, entrançado nas antenas de Internet, espalha seu canto mavioso pelas ruas da cidade. Ainda nos contagia o cheiro da chuva que, abafando a terra seca, faz brota a vida no sertão e nos permite repetir o prazer de um banho de biqueira. Ainda somos sensíveis ao homem enquanto entidade possuidora de sonhos, carências e desejos. Ainda vislumbramos as fronteiras do campo que cercam nossas casas e nos escancaram outros mundos, não mais tão distantes e restritos aos recônditos dos pés de serra, mas interligados pelos modernos engenhos dos transportes e da comunicação.
Mas, mesmo assim, nos sentimos, cada vez mais, também contagiados pela individualidade e solidão. Somos forçados a nos amoldar a um padrão de vida que nos isola, nos aparta dos outros.
Somos cada vez, com mais intensidade, exigidos a nos comportar como homens modernos, movidos pela energia da ciência e da razão. Razão que nos ensina a dar um bom dia apenas por uma exigência de um código de comportamento politicamente correto e não por um sentimento verdadeiro de trocar afetividades e desejar alvíssaras ao nosso semelhante. Metamorfoseamos civilidade, mas, cada vez mais, produzimos barbárie. E, assim, nos enredamos nas redes sociais que, situadas no campo da virtualidade, escancaram a aparente ilusão de uma aldeia global.
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