A Música e a Literatura
Por Padre Renato
A realidade é nua, crua e dura. Não dispensa ninguém e precisamos, sem sombra de dúvidas, de anestésicos para suportá-la, ou, se quiserem, precisamos algum refúgio para a rigidez com que ela nos trata. Caso contrário, corremos o risco de nos transformarmos em estéreis máquinas de “fazer as coisas” que não refletem, não sentem, não amam…
A espiritualidade é um destes abrigos contra a aridez da realidade. Buscar no relacionamento íntimo com o sagrado a água benfazeja que renova as forças após a sensação da secura que o real proporciona é, de fato, muito bom. Assim, ter um lado espiritual, professando-o numa religião, é um valor. É um bem que dispensa maiores palavras, pois é o refúgio propriamente dito. Em Deus encontramos a paz.
As artes são outras formas de suavizarmos os impactos da realidade em nossa humanidade. Dentre elas, cito duas: a música e a literatura, mais particularmente a poesia, seja em prosa, seja em versos.
“A música é vida interior, e quem tem vida interior jamais padece de solidão”, assim terminava o saudoso senador Arthur da Távola os seus programas “Quem tem medo de música clássica”, exibidos pela TV Senado. A música é a mais espiritual de todas as artes. Nela não se toca, nela não se pega. Toca-se num CD, pega-se numa partitura, num pedaço de papel, mas nunca nos sentimentos surgidos no coração de quem escuta a música executada. E não falo apenas escutar com os ouvidos. Isto é muito banal. Falo em escutar com o coração. A música atinge a essência do ser humano, a sua alma.
Que dizer da Sonata “O Clarinho da Lua” – Clair de Lune – de Beethoven (por favor, procurem escutar de algum modo, caros amigos), ou a ária “Rainha da Noite”, da ópera Flauta Mágica, de Mozart, ou “Uma furtiva lacrima” (Uma lágrima furtiva), interpretada por Enrico Caruso, ou “Nessun Dorma” (Que Ninguém Durma), por Pavarotti, ou “Con te partiró” (Partirei Contigo), na voz de Bocelli, do “Fantasma da Ópera”, do insuperável Andrew Lloyd Weber (assistam ao filme!).
Cá no Brasil, que sentimentos bons nos causam “Eu sei que vou te amar”, do Tom Jobim, ou “Sozinho”, do Caetano Veloso, ou que orgulho sertanejo nos causam os cento e vinte baixos de Gonzagão com a “Asa Branca” ou “From United States of Piauí”, de Dominguinhos com a “Vida do Viajante”, ou a alegria saltante do Jackson do Pandeiro e sua “Comadre Sebastiana”, ou a certeza do nosso Edmar Miguel com a “Burrinha da Felicidade” (“Se avexe não, que amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada”). Música é vida, mas música de verdade, como as citadas, respeitados os gostos diversos dos meus.
Mas, a literatura também. Ah, que bom!!! Com uma xícara de café, de chá, ou (eia, gaúchos!!) com um chimarrão de lado, ler um bom livro numa rede ou numa espreguiçadeira ou cadeira de balanço. Saímos daqui vamos para lá… para o mundo das letras. Invadimos o universo do Patativa, dos homens dos cordéis, que às vezes são desconhecidos, mas que são grandes mentes, dos homens das violas em punho que, como metralhadoras, fazem suas rajadas literárias e nos deixam boquiabertos com tanta agilidade mental. Penetramos o mundo de Machado de Assis, de Rachel de Queiroz, de Augusto dos Anjos (porque não?) e nem percebemos que as horas voam… e que os problemas são minimizados.
Que espaço damos para as artes e para o lazer em nossas vidas?
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