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Mariana Moreira

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A doce sina do nome

11/06/2020 às 09h26

Coluna de Mariana Moreira

Quando nasci, pelas mãos da parteira Mãe Ana Preá, em um final de tarde de agosto, meu pai decide me dar o nome de sua mãe, Mariana.

Um nome comum, simples, mas que trazia o pesado e incômodo fardo de ser considerado nome de “velha”.

E por minha infância e adolescência arrasto correntes pela herança do nome. Na escola e, mais tarde, no colégio e mesmo na universidade sou única, escoteira, sem as “xarás” com quem estabelecer referências do nome comum.

Minha avó não a conheci. Faleceu dois anos após meu nascimento. Suas memórias as construí nas falas, narrativas e depoimentos acerca de sua inteligência ímpar, sua capacidade de superar os trancos que a vida reservava às mulheres do final do século XIX, onde analfabetismo, invisibilidade, subserviência se naturalizavam nas justificativas sociais, culturais e políticas do ser feminino. Só aprende a ler e escrever na velhice, quando desejou depositar um dinheiro, fruto de suadas economias, em uma conta no Banco de Antônio Rolim. A necessidade de assinar o nome é atendida pelas lições de uma das filhas.

E Mariana, a avó, vai sendo inventada, construída, rascunhada e desenhada na história de sua neta. Suas memórias são, em incontáveis bocas de noite, inspiração e protagonismo nas lembranças paternas, costuradas ao sabor do balanço da rede e de atentos ouvidos infantis dispersos pelo chão da sala fugazmente iluminada pela lamparina a querosene.

E o pesado fardo do nome ganha leveza. A singularidade não mais incomoda. A ausência de “xarás” perde significância.

E ser mais uma Mariana Moreira me encanta, envaidece, agiganta, como gigante foi aquela Mariana, a avó, que, na invisibilidade de uma sertaneja, pequena agricultora, se faz presença e presente em minha vida.

E é para ela, Mariana, a avó, que a neta Mariana partilha da poesia da mineira Adélia Prado, nos tornando, Marianas e Adélias, traduções de Marias tantas, que crescem e agregam anas, adélias, e todas nós.

Quando nasci um anjo esbelto,

desses que tocam trombeta, anunciou:

vai carregar bandeira.

Cargo muito pesado pra mulher,

esta espécie ainda envergonhada.

(…)

Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.

Inauguro linhagens, fundo reinos

— dor não é amargura.

(…)

Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.

Mulher é desdobrável. Eu sou.

 


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

Mariana Moreira

Mariana Moreira

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