VÍDEO: Desconhecimento e informações falsas criam mitos sobre a Lei Maria da Penha, que completa 17 anos
Embora tenha sido um instrumento fundamental na proteção de mulheres contra violência de gênero, ainda persistem o desconhecimento da lei e informações falsas sobre ela
Uma matéria da jornalista Letícia Mori na BBC Brasil mostra alguns mitos a respeito da Leia Maria da Penha, que entrou em vigor em 2006 para melhorar a prevenção e o combate à violência doméstica. Embora tenha sido um instrumento fundamental na proteção de mulheres contra violência de gênero, ainda persistem o desconhecimento da lei e informações falsas sobre ela.
Até 2006, casos de violência doméstica eram tratados na Justiça como casos de “menor potencial ofensivo”, ou seja, as penas para agressores eram no máximo pagamento de multa ou trabalhos comunitários. Significa que a violência doméstica era “banalizada” no âmbito jurídico.
Mas a Lei Maria da Penha fez com que a violência contra a mulher passasse a ser tratada como um crime de grande potencial ofensivo e por isso as penas aumentaram. Além disso, facilitou a criação das medidas protetivas de urgência, que é um importante instrumento cada vez mais utilizado pelas mulheres. Soma-se às mudanças na legislação outro aspecto importante trazido pela Lei Maria da Penha, que é a promoção de programas educacionais e o fortalecimento de redes de apoio às mulheres.
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Contudo, existem narrativas enganosas e informações falsas que, na maioria das vezes, tentam deslegitimar a lei, enfraquecer o enfrentamento à violência e acabam incitando a misoginia.
Principais mitos
Mito: a lei facilitaria condenação de homens inocentes
Um dos principais mitos que persistem sobre a Lei Maria da Penha é que um homem pode ser condenado apenas com a palavra da vítima, o que poderia levar à condenação de inocentes.
A advogada Paula Nunes Mamede Rosa, criminalista pela USP e professora da Universidade de Northumbria, no Reino Unido, explica que a Lei Maria da Penha estabelece que as medidas protetivas podem ser concedidas pelo juiz com base na palavra da vítima, sem necessidade de manifestação do Ministério Público ou de ouvir o agressor. Mas elas não modificam as exigências para uma condenação penal. A medida protetiva é uma medida temporária que busca proteger e prevenir novos casos de violência. A condenação penal é uma resposta punitiva do Estado a um crime, portanto passa por todos os trâmites jurídicos exigidos pela Legislação.
Mito: A aplicação da lei sempre resulta em prisão do agressor
Embora trate da questão punitiva na Justiça, a Lei Maria da Penha visa o combate à violência doméstica de forma ampla, incluindo o uso da educação e a reeducação de agressores.
Regina Célia, vice-presidente do Instituto Maria da Penha, esclarece que a lei é também pedagógica e não veio para desagregar famílias apenas punindo o agressor. “O que enfraquece a família é a violência doméstica”, diz ela.
A lei fala sobre a criação de centros de reeducação e reabilitação para autores de violência, fala sobre delegacias especializadas, centros de referência de atendimento à mulher, fortalecimento de defensorias públicas, entre outras medidas. Ou seja, uma grande parte da aplicação da lei envolve medidas tomadas pelo Poder Executivo, como a formação permanente dos agentes de Segurança Pública e a criação de uma matriz pedagógica para aplicar nas escolas que trate do tema da violência de gênero. A resposta penal, ou seja, a punição do agressor, é só um dos mecanismos para lidar com esse problema.
Mito: A lei é usada por mulheres como vingança
A ideia de que mulheres que não sofreram violência denunciam falsas agressões é um mito. Inúmeros dados mostram que, na realidade, o que acontece de forma generalizada é o contrário: a maioria das mulheres vítimas de violência de um parceiro ou ex-parceiro não denuncia o agressor à polícia por medo do agressor ou de ser desacreditada.
A pesquisa “Vitimização das Mulheres no Brasil”, de 2013, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, indicou que 45% das mulheres que haviam sofrido agressão no último ano ficaram caladas, 21,3% delas não acreditavam que a polícia iria oferecer solução e 14% não acreditavam que tinham provas suficientes.
Mito: A história do ex-marido de Maria da Penha Fernandes, que inspirou a lei, não foi ouvida
Para quem ainda não sabe, a Leia Maria da Penha foi assim batizada em homenagem à brasileira Maria da Penha Fernandes, que ficou paraplégica após duas tentativas de homicídio por parte do então marido. No entanto, um vídeo publicado esse ano trazia o ex-marido de Maria da Penha contando outra versão dos fatos. Mas essa versão dele é inverídica, segundo a Justiça brasileira e a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH).
O que aconteceu foi que, após inúmeros episódios de violência doméstica, o ex-marido deu um tiro na coluna que a deixou paraplégica. Meses depois, ainda tentou eletrocutá-la durante o banho. Os crimes aconteceram em 1983 e Maria da Penha passou 19 anos apresentando inúmeras provas à Justiça brasileira que comprovavam a tentativa de homicídio, mas a Justiça só condenou seu ex-marido em 2002. Dos seus anos de condenação, ele só cumpriu dois.
O caso foi apresentado em 2001 à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que condenou o estado brasileiro por negligência e fez uma série de recomendações para evitar que outras brasileiras sofram tragédias como a de Maria da Penha.
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