VÍDEO: Reportagem especial sobre a Transposição mostra demolição de casas e tristeza de famílias em Cachoeira
Moradores que residem nos sítios Lajes, Redondo, Pedras Pretas e comunidades adjacentes na zona rural do município de Cachoeira dos Índios não conseguem conter a emoção quando falam da terra que eles precisam abandonar para que chegue o progresso
Uma obra, duas perspectivas. A alegria pela chegada da água no Alto Sertão da Paraíba contrasta com a tristeza de quem precisa deixar uma parte da sua história para trás.
Moradores que residem nos sítios Lajes, Redondo, Pedras Pretas e comunidades adjacentes na zona rural do município de Cachoeira dos Índios não conseguem conter a emoção quando falam da terra que eles precisam abandonar para que chegue o progresso.
Localizado no extremo oeste da Paraíba, a quase 500 km de João Pessoa, Cachoeira dos Índios é um dos vários municípios sertanejos que serão contemplados com canais do Projeto de Integração do Rio São Francisco. O projeto permite o abastecimento de açudes e rios intermitentes, ou seja, que ficam vazios nos períodos de seca.
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As águas do ‘velho Chico’ chegam por dois eixos: o Leste, que abastece cidades do Pernambuco e da Paraíba; e o Norte, que leva água para Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. A transposição acontece através de canais e sistemas de bombeamento. O principal objetivo é ajudar a resolver a crise hídrica na região fornecendo água para consumo humano e para a agricultura.
Cerca de 15 municípios paraibanos que ficam na microrregião de Cajazeiras, no Alto Sertão do estado, deverão ser contemplados direta e indiretamente pela transposição. É o caso de Cachoeira dos Índios, onde está sendo construído o reservatório e barragem Tambor. No entanto, a mesma obra que é considerada a redenção do Semiárido nordestino, também ocasiona transf0rmações geográficas e sociais que impactam os moradores de outra forma.
Se apoiando nas ruínas da casa onde morou desde criança, dona Cícera Maria, de 62 anos, sente a dor da partida. “Quando eu vim morar nessas Lajes, eu tinha dois aninhos de idade. A recordação é grande, mas eu só peço a Deus que dê força para aqueles que vão ficar”.
Na zona rural de Cachoeira dos Índios, cerca de 60 famílias tiveram que deixar seus lares para possibilitar a execução plena da obra de construção do açude Tambor, que será abastecimento pelo ramal do Apodi. Ao todo, este trecho da transposição vai beneficiar cerca de 750 mil pessoas em 54 cidades do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco.
O ramal do Apodi vai levar as águas do Eixo Norte a 54 municípios através da estrutura de controle do Reservatório de Caiçara, na Paraíba, até o Reservatório Angicos, no Rio Grande do Norte, em uma extensão total de 115 quilômetros. O investimento federal na obra é de cerca de R$ 1,5 bilhão.
A água, enfim, chegará às comunidades sertanejas em tempos de estiagem. É um sonho antigo se tornando realidade. Mas existe um outro lado dessa história, que é o aspecto afetivo na relação entre as famílias e seus antigos lares.
Nossa equipe conversou com alguns moradores de comunidades que eram tradicionais na zona rural de Cachoeira dos Índios, mas que agora praticamente deixarão de existir por conta das transformações geográficas que a transposição do Rio São Francisco provoca. É o contraste entre a felicidade pela chegada da água e a tristeza de se despedir das ruínas de cada casinha onde as famílias escreveram parte da sua história.
Sítios e comunidades rurais são muito mais do que um conjunto de residências. Com o passar do tempo, esse locais se tornam uma irmandade que marca no território outras características sociais próprias, da política à religião, do comércio à cultura, da paisagem aos costumes linguísticos.
Dona Deta, moradora do sítio Lajes há 40 anos, se emociona ao explicar o significado dessa experiência. “Muita amizade com todo mundo e vai ficar muita saudade, porque eu não vou esquecer o resto da vida. É difícil demais. Eu não tenho nem palavras para falar o quanto eu vou sentir saudade”.
Dona Maria Anália, que já não mora na comunidade há algum tempo, se solidariza com a amiga que em breve deixará a casa no sítio Lajes para que a obra passe pelo local. “Ela sempre estava presente na minha vida e eu na dela. Hoje, quando eu cheguei aqui e vi tudo sendo destruído, foi muito angustioso para mim”.
João Victor, de 17 anos, é da nova geração do sítio Lajes. A casa onde ele morou por 16 anos também está sendo demolida. Apesar de jovem, ele já tem muitas lembranças marcantes do tempo em que morou no sítio. “Meu irmão mais velho mirou aqui por 21 anos e saiu quase chorando. É triste”.
A obra do Ramal do Apodi foi iniciada em junho de 2021, após decisão do Governo Federal de retomar as estruturas previstas no projeto original da transposição do Rio São Francisco, que incluem ainda os ramais do Agreste, em Pernambuco, já concluído, e do Salgado, no Ceará, cujas obras estão sendo licitadas. Operários seguem trabalhando na construção do reservatório Tambor, em Cachoeira dos Índios. E assim, a cada pá de terra, a cada aqueduto que se levanta, a paisagem vai se transformando.
Francisco Ricarte, conhecido como Bodinho, já foi prefeito de Cachoeira dos Índios e sabe da importância da transposição para o município, mas também compreende da dor das famílias. “A gente fica preocupado porque não sabe ainda onde essas famílias vão residir futuramente”.
Nós entramos em contato com o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) no dia 29 de junho, através de e-mail, para sabermos de que forma o Governo Federal tem dado suporte financeiro ou indenização para essas famílias e se elas serão contempladas com novas moradias em algum tipo de vila de produtores. No mesmo dia, a assessoria respondeu afirmando que encaminhou nossa solicitação ao setor competente, mas até o fechamento desta reportagem, não recebemos nenhuma informação.
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