Visita ao cabaré de Lilia
Por Francisco Frassales Cartaxo – A festa chegava ao fim, os recém-casados já estavam no aconchego do Brejo das Freiras, mas ainda rolava uísque. De repente, ele me puxa pelo braço e sussurra em jeito de quem dá uma ordem:
– Agora a gente vai visitar Lilia.
Cabeça branca ingere a última dose, enquanto procura nos bolsos a chave do carrão de viajar para as fazendas de gado. Vou lhe deixar em casa, disfarça, falando em voz alta, que ir agora? E lá fomos nós, ele confidenciando que se revelasse nosso destino teríamos a má companhia de um magote de bêbados… Saímos das proximidades da igreja matriz, com sua imponente torre que se sobressai na paisagem urbana de Cajazeiras.
Logo chegamos.
A calma no entorno contrastava com a luz vermelha e o som lá dentro, de onde vinha solto o dançante ritmo do forró. Mal entramos, Lilia surge como uma deusa do pecado para o abraço de saudade, quanto tempo doutor, pensei que tinha esquecido essa velha amiga ou então… mais eu não pude ouvir, que segredo murmurado ao ouvido não se escuta. Uma mesa foi posta em lugar adequado para aquele reencontro deles dois, sob olhares curiosos, vindos de duas mesas ocupadas por rapazes estranhos a nós. Com um gesto, cabeça branca interroga Lilia. Se preocupe não, é tudo gente boa, fregueses que conheço de muito tempo. Um cochicho ao pé do ouvido levou Lilia aos rapazes, cada um em sua mesa, acompanhados de garotas. Não demorou, os dois vieram agradecer a quem lhes pareceu um poderoso chefe político no estilo Otacílio Jurema.
– Que diabo você mandou dizer?
– Nada demais, pedi para avisar a eles que toda a despesa é por minha conta… e, animado, discretamente, ordenou: aqui não entra mais ninguém, feche a porta. Lilia cumpriu a determinação e abriu um largo sorriso com beijos e abraços. Que porra ele está preparando agora, eu me interroguei. Sem tardar, a resposta veio com a irresistível recomendação, ei menina, coloque um bolero daqueles bem arretado… quero mais sensualidade no ar.
E todos dançamos.
E as meninas, numa euforia contagiante em pleno meio da semana, enroscavam o corpo no ritmo lento da música. Uma garota com feições de índia, nem bem saída da adolescência, se destacou, retorcendo-se sozinha na imitação de uma cobra, em cima de uma mesa surgida do nada, sob aplausos de todos nós, inflamados que nem torcida de escola de samba, aos gritos etílicos a cada peça da roupinha jogada em nossa direção.
Antes do sol nascer, já em casa, eu sonhava na rede, uma herança indígena.
Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.
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