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Francisco Cartaxo

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Traição e massacre na ditadura

22/10/2017 às 11h01

O delegado Sergio Fleury (1933-1979) comandou o "Massacre da Granja de São Bento"

– Será que tem galinha ao molho pardo hoje?

– Tem peixada.

Este diálogo parece papo de turista em restaurante nordestino. Não é. É senha e contrassenha usadas por membros da Vanguarda Popular Revolucionária, a partir de fevereiro de 1972, na varanda do Maxime, boteco na beira-mar do Pina, na zona sul recifense. O companheiro que acabava de chegar à cidade estaria com punhos fechados sobre uma das colunas de sustentação da varanda do boteco, contemplativo, os olhos fixos nas ondas quebrando na praia. Esta informação abre um dos 14 capítulos do livro O massacre da Granja São Bento, do jornalista Luiz Felipe Campos, que venho comentando. Um a um foram chegando ao Recife váriosremanescentes do que restava da VPR, um dos grupos de luta armada, formados para combatera ditadura instalada com o golpe de 1964.

Cabo Anselmo preparava o terreno.

Nessa época, o sergipano, ex-aluno salesiano,Anselmo já integrava de corpo e alma o esquema repressivo violento, comandado pelo delegado Sérgio Fleury. Foram atraídos para o Recife: Jarbas Pereira Marques, pernambucano residente em São Paulo, onde levada vida legal com sua esposa, mas era fichado na políciacomo subversivo por ter sido preso quando estudante secundarista no Recife, cidade que conhecia bem.Por isso, Anselmo o recrutou. O gaúcho Evaldo Luiz,ex-marinheiro, bom atirador, amante das artes marciais e do futebol. Eudaldo Gomes da SilvaEudaldo estava entre os 40 presos políticos trocados pelo embaixador alemão, Von Holleben, e levados para a Argélia.Baiano, militara no movimento estudantil, tendo presidido o diretório acadêmico de agronomia, às vésperas do AI-5,no agitado ano de 1968. Foi induzido à luta armada por Amílcar Baiardi, a respeito de quem falarei em outra oportunidade. De lá foi para Cuba, onde conheceu a checa, Pauline Reichstul, que se tornou sua companheira. Paulinee a paraguaia SolidadBerret, namorada do cabo Anselmo, foram as duas mulheres trucidadas na operação da chácara São Bento.O ex-cabo da Marinha, José Manuel da Silva, não precisou usar a senha no Maxime. Permaneceu morando em Toritama, desenvolvendo atividades políticas sem maior repercussão, na então pacatacidadedo agreste pernambucano, onde chegou a ser professorde escola estadual.

Que vinham fazer no Recife?

Montar um núcleo de luta armada. Em Cuba e no Chile, exilados brasileiros queriam rearticular a esfacelada resistência armada no Brasil, um arremedo de foco guerrilheiro urbano. Para isso, armavam fachada legal, incluindo uma loja em Olinda, alugaram imóveis, compraram veículos e um sítio perto de Abreu e Lima.
Era tudo uma farsa.

Anselmo na verdade executava um plano articulado por Sérgio Fleury. Nessa época, 1971/1972, a esquerda armada(dividida em pequenos grupos com militantes que restaram da forte repressão do governo Médici) ainda não tinha certeza de que Anselmo se tornara um agente duplo. Ele se instalou em Olinda, com o cognome de Jadiel, simpático, fez amizades, frequentou bares da moda, criou ambiente. Um dia sumiu. Pouco depois, reapareceu com a bonita jovem, Lita. Lita era SolidadBarret, com quem viveu numa casa em Olinda, na frente da qual instalaram a Butique Mafalda. Na verdade, um biombo para esconder a verdadeira missão aqui: destruir o que restava de organizações clandestinas, cujo lance mais espetacular foi o massacre do grupo da VPR. O delegado Fleury comandou a ação, pessoalmente, como veremos em próximo artigo.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
escritos.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

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Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
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