Santa Maria Lica Dantas
Por Francisco Frassales Cartaxo
Vez por outra, escuto minha esposa fazer esta invocação: Lica, me ajude a encontrar logo. O “perdido” dentro de casa pode ser os óculos, a agenda ou outro objeto qualquer. Célia Maria é carioca. Veio para o Recife, ainda menina, acompanhando os pais e aqui reside desde sempre. Mal conhece Cajazeiras. Me acompanha quando visito familiares e amigos. Nunca viu Lica, até pela idade, mas ouvia minha irmã, Joaninha, recorrer a ela em momentos de aperreio para achar perdidos em algum desvão da casa. E tanto era o sucesso da invocação da cunhada que Celinha também adquiriu aquele costume.
Quem morou em Cajazeiras, aí pelos meados do século XX, com certeza, conheceu Lica Dantas. Pelo menos a viu na rua, sempre com vestes compridas, arrecadando com delicadeza alguma coisa de serventia para ajudar gente mais pobre do que ela. Lica viveu para isto: dedicar-se aos mais necessitados, repassando-lhes o que recebia das pessoas de boa vontade. Socorria carentes com remédios, lençóis, roupas, matava a fome de muitos, numa época em que a assistência social dos governos era muito mais precária do que hoje. Lica foi sempre pura dedicação, carinho e amor.
Mas como era mesmo Lica Dantas?
Quem lhe traça o perfil físico é alguém que a conheceu quando era jovem estudante. E descreveu Lica, com base em recordações adolescente:
Tinha um corpinho delgado, os cabelos meio liso e longos, já apresentando alguns fios brancos, era calma e de voz ponderada, mas de olhar firme. Sua maneira de vestir era simples, seus vestidos tinham modelo comum; cor de sua preferência: azul marinho.
Aí estão palavras de minha confreira da ACAL, Irismar Gomes da Silva, que, anos depois,teve a honra de ser a primeira diretora e professora, ao mesmo tempo, da escola que recebeu o seu nome: Lica Dantas. Cito o livro Cajazeiras e minhas lembranças, de Irismar.
Maria Lica Dantas nasceu no município de São João do Rio do Peixe. Ainda muito jovem resolveu mudar-se para Cajazeiras, levando duas sobrinhas para servir-lhe de companhia, morando em casa simples, incendiada alguns anos depois. O sonho de Lica era construir um abrigo para os pobres. Não conseguiu, como informa Rosilda Cartaxo Dantas, no livro Mulheres do Oeste, escrito muito tempo depois. Lica faleceu no dia 24 de janeiro de 1958. Em sua homenagem fundou-se em Cajazeiras a Escolinha Profissional Lica Dantas, que, em 1970, virou Grupo Escolar e agora tem o pomposo nome de Escola Estadual de Ensino Fundamental Lica Dantas, na rua Felismino Coelho. Não sei como está hoje. Pela descrição, em site na internet, a EEEF Lica Dantas anda em petição de miséria!
Dada a experiência aqui de casa, sei muito bem que, em momentos de pequenas agonias pelo sumiço de algum objeto, a invocação à Lica nunca falha! Pela figura humana que foi, despida de vaidade e coberta de amor ao próximo, Lica jamais será esquecida. E até deve ser tratada, como fez Rosilda, em Mulheres do Oeste, ao colocar em sua crônica este título: Eu a chamaria de Santa Maria Lica.
Rosilda Cartaxo também não será olvidada.
No dia 31 desde mês ocorre o centenário de seu nascimento. Ela é Patronesse da ACAL, Cadeira Nº 37, ocupada por Edna Marlowa Cartaxo Braga. Por isso, será lembrada e festejada como é possível em época de pandemia. Que Deus as tenha a seu lado. Juntas.
Presidente da Academia Cajazeirense de Artes de Letras – ACAL
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