Porque sou política
Eleições em reta final e algumas reflexões se impõem como importantes para que nos posicionemos de forma propositiva neste processo.
A primeira questão que se apresenta é um argumento que, de uso tão recorrente, torna-se lugar comum: eu não gosto de política. Ora, eleições é apenas uma ínfima parte de toda uma conjuntura que nos envolve e nos posiciona como seres políticos. A nossa condição e constituição de humanidade foi e continua sendo uma decorrência de nossa capacidade de, nas interações com outros humanos e com o nosso meio, produzir concepções, definições, conceitos que expressam e revelam nossas posições. Eu não existo, fora do invólucro biológico, se não interagir e permutar saberes, experiências, vivências, sentimentos com outros semelhantes.
Eu não me constituo, não falo, não penso, sem a aprendizagem que, desde a mais tenra infância, vou seguindo na observação dos mais velhos, na imitação dos referenciais, na elaboração e repetição de gestos, atitudes, posturas constituídas a partir de valores. Valores que traçam fronteiras entre o certo e o errado, o legal e o ilegítimo, o válido e o recusável. Ou seja, o desenho de permanente percurso educativo que, por toda a vida, vai te situando em lugares e situações, vai te agregando estranhos e diferentes, vai te somando novidades e desconhecidos, vai te subtraindo intolerâncias, egoísmos. Sou político porque não transcendo a mera condição biológica sem interações e relações humanas que me transformam, me talham, me desenham.
O meu voto, portanto, é apenas uma entre as inúmeras atitudes políticas que, no cotidiano, sou levada a assumir em razão de minha condição de humanidade.
Gostar ou não de política traz implicações que extrapolam os limites de minhas posições e convicções pessoais.
Gostar ou não de política traduz o amor ou o ódio pela pessoa humana e pelo planeta onde habito e que me acolhe.
Gostar ou não de política representa acolher ou repulsar o de pele de cor diferente.
Gostar ou não de política significa abraçar ou repelir o que vive a sexualidade fora dos ditos padrões de “heteronormatividade”.
Gostar ou não de política significa eudeusar ou apedrejar as mulheres.
Gostar ou não de política significa erguer altares ao meu deus único e senhor de todas as coisas, ou reverenciar e respeitar as crenças e convicções de quem cultua e celebrar outros deuses.
Gostar ou não de política, enfim, significa aceitar o outro apenas como mera expressão de meu reflexo, ou aceitar o diferente que, nas contradições, singularidades, especificidades, me complementa como ser humano e, comigo, sem igualdade imposta, mas com liberdade construída, busca urdir o mesmo trançado e a mesma trama de vida e de planeta.
E Milton Nascimento, em poesia, traduz meu Coração Civil:
Quero a utopia, quero tudo e mais
Quero a felicidade nos olhos de um pai
Quero a alegria muita gente feliz
Quero que a justiça reine em meu país
Quero a liberdade, quero o vinho e o pão
Quero ser amizade, quero amor, prazer
Quero nossa cidade sempre ensolarada
Os meninos e o povo no poder, eu quero ver
São José da Costa Rica, coração civil
Me inspire no meu sonho de amor Brasil
Se o poeta é o que sonha o que vai ser real
Bom sonhar coisas boas que o homem faz
E esperar pelos frutos no quintal
Sem polícia, nem a milícia, nem feitiço, cadê poder?
Viva a preguiça viva a malícia que só a gente é que sabe ter
Assim dizendo a minha utopia eu vou levando a vida
Eu viver bem melhor
Doido pra ver o meu sonho teimoso, um dia se realizar.
Mariana Moreira
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