Papo de feira livre
Vestido numa camisa preta, presenteada pelo advogado Dirceu Marques Galvão, comprava produtos orgânicos na feira do sábado, no Recife. Perto de mim, um cidadão desconhecido me observa. Repara minha camisa, aponta a logomarca do Sete Candeeiros Cajá.
– Que é isso, amigo?
– Um antigo cabaré de minha cidade.
– E qual é sua cidade?
– Cajazeiras, na Paraíba.
– Conheço, bem pertinho do Ceará, estive lá… nas fazendas dos Barreto.
O diálogo ocorreu no Recife, em pleno ruge-ruge da feira dos trabalhadores sem-terra, na histórica Praça da Casa Forte. Aí, começou um papo, no qual Cajazeiras e filhos de Vicente Barreto (Jesus, Luiz, Bosco, Malu, Caveirinha) foram personagens momentâneos, surgidos da amizade daquele senhor que eu nunca vira. O papo foi interrompido, todavia, por uma cidadã, carregada de compras. Ela transferiu metade sacolas cheias de verduras para seu marido e ordenou: vamos logo para o carro. Ele obedeceu sem me dar chance de perguntar seu nome. Sem um bom dia sequer, lá se foi ele, com tempo apenas de gritar prazer em conhecer o senhor, em meio ao burburinho da feira.
Mal pude ruminar o que ouvira, eis que surge, de meia barba, como sempre, os óculos maiores que o rosto, o escritor Ronaldo Correia de Brito, autor do romance Dora sem véu, resenhado por mim, faz pouco tempo.
– Quando for ao Cariri, você precisa ir a Cajazeiras.
– Eita, Cartaxo, eu estou em falta com Cajazeiras, recebi convite da Livraria Universitária, mas chegou em momento de muito aperreio. Resultado, não pude ir.
Falamos então da livreira Regina Moura, de suas ousadas iniciativas culturais. Aproveitei a embalagem para dizer, como quem não quer nada, da nossa Academia de Artes e Letras e da Editora Arribaçã. Ronaldo prometeu visitar Cajazeiras, em ocasião propícia para o bate-papo entre interessados em coisas das artes, de literatura, de poesia, enfim desse mundo prazeroso da leitura, que abarca a vida, o amor e a morte, para lembrar frase de Juan Rulfo, mestre de todos nós.
Ronaldo Correia de Brito é um arretado.
Médico, consolida-se muito bem como romancista. Antes, já se afirmara cronista, teatrólogo, contista. Sua peça, Baile do Menino Deus, é encenada em época de Natal, aqui no Recife, há 16 anos! Você, não está de saco cheio, lhe perguntei certa vez, e ele, que nada, a cada ano eu altero a apresentação e renovo as emoções. Disse, com seu sorriso tímido-vaidoso de matuto, nascido no ressequido sertão dos Inhamuns, com passagem pelo Crato.
Tudo isso, vivi na feira de produtos orgânicos, dos sem-terra. Sábado de manhã cedo, eles expõem seu suor e sua luta em forma de alface, rúcula, salsa, pepino, agrião, nabo, rabanete, brócolis, couve, alecrim, hortelã, batata doce, jerimum, macaxeira, inhame, ovos, frutas, enfim, tudo o mais, produzido em vários assentamentos, localizados na zona da mata e no agreste de Pernambuco, alguns a uma distância de 60 quilômetros.
Na feira do Recife espanto a saudade de Cajazeiras.
Da feira do sábado, na Coronel Matos, cada vez maior e mais variada na oferta de artigos do campo. E o moído? Ah, o moído da feira! Mês passado, ao lado de José Audísio, andei pra cima e pra baixo, revendo amigos e, pasme, até eleitores que, lá atrás, em outros tempos, votaram em mim para prefeito de Cajazeiras. Comprei queijo de coalho, como sempre faço. Dessa vez, trouxe pequi, vindo do Cariri, direto para o feijão da minha infância! E o moído? Só vale na Coronel Matos!
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