Oradores de comício
Por Francisco Frassales Cartaxo
Comício político hoje em dia perdeu o sentido. E não é por causa da covid-19. Acabou a significação que, no passado, o comício tinha em si mesmo, como um elo que aproximava o eleitor do candidato. As pessoas se reuniam em praça pública para ouvir seus candidatos. Ouvir e ver. O candidato trepado no palanque e o votante cá em baixo.
Muitas vezes para conhecer, mesmo de longe, aquele em quem iria votar. É claro que não me refiro aos tempos atuais, caracterizado pela presença de meio de comunicação de massa (televisão, rádio) e toda essa mistura de redes e siglas penduradas na internet, que deixa o mundo ao alcance de um celular. Pouco importa que a informação seja difusa e a fronteira entre verdade e mentira nas redes sociais não passe de um fio de cabelo. Às vezes, sob anonimato criminoso.
Falo do passado de Cajazeiras.
De uma época que nem emissora de rádio havia aqui. Só existiam os serviços de alto-falantes: DRC – Difusora Rádio Cajazeiras, DRP- Difusora Rio do Peixe ou A Voz do Sertão. Em campanhas estaduais, o comício era o acontecimento mais importante da campanha. As pessoas compareciam com roupa de domingo. Gente da cidade e da zona rural. Quem morava perto vinha a pé ou montado. Os de longe, em caminhões, jeep ou rural. Vinham de Boqueirão, do Riacho Fundo, de Catingueira, Cipó e até de Impueiras. Da Serragem, das Melancias, da Prensa, do Catolé, de Cachoeirinha, de Patamuté, da Serra Vermelha. De tudo quanto era lugar chegava gente, que se aglomerava em torno do palanque, quase sempre, na avenida Presidente João Pessoa.
A gente se abalava de casa para escutar famosos oradores da Paraíba: Zé Américo, Argemiro, João Agripino. Rui Carneiro era péssimo de palanque. Bom mesmo era Alcides Carneiro. Mas cada um tinha o que dizer. Cada um com seu jeito de mexer com a emoção do povo. E a gente ficava em silêncio prestando atenção. Meu pai quase não ia a comício. Então, eu tentava repetir para ele, com minhas palavras, o que me parecia mais importante.
Numa eleição para o senado, Cajazeiras se agitou.
Assis Chateaubriand queria ser senador. Para despistar as negociatas, feitas com as cúpulas partidárias, trouxe um engodo: mostrar a televisão aos sertanejos. A maior maravilha do mundo… mandou instalar transmissores portáteis e aparelhos de tv nas imediações do evento. Na hora do comício, a gente via na telinha o que se passava no palanque. Um arraso. A novidade atraiu mais curiosos do que eleitores!
Quem reinava nesse tempo em Cajazeiras, como orador de palanque, era o advogado José Rolim Guimarães. Não tinha muitos votos, mas todo mundo gostava de ouvir seu vozeirão. Modulava a voz. Soltava frases de efeito. Usava de ironia, dando muito trabalho aos adversários. Tal como fazia nas sessões do júri popular, ao defender seus clientes.
Nas campanhas municipais, vez por outra, aparecia um orador de temporada. Em 1955, Abdoral Henrique de Araújo foi quase um fenômeno local. Odontólogo, recém-formado na Bahia, orador da turma, candidato a vereador, pelo PSD, fez-se a atração dos comícios, no meio de políticos avessos a microfone: Severino Cordeiro, Nelson Maciel, Júlio Marques, Zé Palmeira. Simpático, inteligente, Abdoral virou estrela de palanque, com seu cortante timbre de voz. O jovem dentista foi o quinto mais bem votado. Três anos depois, foi ser prefeito no Barro, sua terra. Bem mais tarde, virou pastor evangélico da Igreja Batista, em São Paulo. Nunca mais apareceu aqui.
Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL
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