O velho e o cirurgião
Francisco Frassales Cartaxo – No mais antigo hospital do Recife, fundado no tempo do Império, o paciente ouve do médico úteis esclarecimentos antes da cirurgia agendada. O uso do robô permite maximizar a eficácia, minimiza o caráter invasivo do procedimento, reduz o tempo de recuperação etc. O urologista explica com ajuda da tela do computador ou desenha à mão em folha de papel. A tudo o velho presta muita atenção. Quando alguns termos empregados pelo médico fogem de seu linguajar, ele traduz em palavras de mortais.
Cresce a empatia entre os dois.
– Então, posso ficar tranquilo. Tudo correrá bem e logo voltarei à leitura, aos jogos na televisão…
– Com certeza. O normal é o paciente sair da ala de recuperação e ir direto para o quarto, sem precisar da UTI.
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A conversa deriva para assuntos amenos.
Dias antes, doutor Clóvis havia operado, em outro hospital, um amigo meu, conterrâneo, defensor da preservação da memória histórica de Cajazeiras. Pernambucano do Recife, o médico já está acostumado a atender gente da Paraíba. Citou alguns casos de colegas de profissão, que o procuram mesmo sem conhecê-lo. Um até me levou, disse, para um fim de semana em Campina Grande.
A consulta virou animado papo!
Tanto que ele narrou um caso pronto para entrar no “balaio de gato” do escritor Helder Moura. Deu-se assim. Ainda jovem, o médico realizou procedimento cirúrgico na próstata de um senhor magrinho, na faixa de sessenta anos, que cuidava bem da saúde para manter a tradição de longevidade da família. Vinte anos depois, continuava bem-disposto, com enorme vontade de espichar a vida, adotando dieta e hábitos mais rigorosos ainda. Mas necessitava de nova intervenção na próstata, revelada em ressonância magnética. Ora, isso não é bicho-de-sete-cabeças, tranquilizou o cirurgião. Mesmo assim, notou um ar de preocupação em seu cliente, pensativo, macambúzio.
– Que é, amigo, algum problema?
– Doutor, estou aqui matutando… daqui a vinte anos, quando eu voltar para a terceira cirurgia, será que você ainda estará vivo?
Gargalhamos.
Ainda rindo eu emendei: fique tranquilo, doutor Clóvis, daqui a 20 anos, eu não voltarei aqui, longe de mim querer viver mais do que os 99 anos do padre Rolim! Aí a conversa tomou o rumo de Cajazeiras. E diante da curiosidade do doutor Clóvis Fraga, aproveitei para falar a respeito de nosso grande benfeitor, do pôr do sol visto do Açude Grande, da expansão recente do ensino superior, patati-patatá…
Sócio da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
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