O outro padre Rolim
Estimulado pelas homenagens prestadas no dia 21 de abril a Tiradentes, amigo meu perguntou-me se o padre Rolim, um dos condenados na Inconfidência Mineira, era parente do nosso padre Inácio de Sousa Rolim. Respondi de pronto, não, não era. Eles têm origens diferentes e pouquíssimas afinidades, salvo a de serem sacerdotes. Um ordenado em Coimbra em 1779, o outro em Olinda em 1825. Diria mais, até formam um contraste quase perfeito, como figuras humanas, como membro do clero, sem contar a trajetória de vida que cada um percorreu. O de Minas, nascido no meado do século XVIII, ou seja, bem antes do outro que veio ao mundo em 1800. O mineiro teve sinuosa missão religiosa, oposta ao tranquilo e dedicado desempenho do filho de Vital Rolim.
O sociólogo José Murilo de Carvalho, ao falar dos clérigos brasileiros que se envolveram em antigos movimentos rebeldes, assim resumiu o perfil daquele sacerdote: Padre Rolim era rico e agiota. Já se vê que ele se referia ao padre Rolim que nada tem com o nosso. Os dois padres Rolim não são parentes. Muito menos parecidos. Ao contrário, estão a anos-luz de distância.
O mineiro José da Silva e Oliveira Rolim nasceu em 1747 no Arraial do Tijuco, hoje cidade de Diamantina, a terra de Juscelino Kubistchek. Era considerado o mais rico dos inconfidentes. Sua fortuna provinha de três fontes principais. Todas contaminadas de sujeira e corrupção: contrabando de pedras preciosas, tráfico de escravos e agiotagem. Até sua formação religiosa, dizem, tem origem espúria. Ele quis ser padre, menos por vocação e mais para fugir de processo judicial. Fez-se rebelde para aproximar-se de conspiradores idealistas com o objetivo de obter vantagens. Mesmo assim foi útil ao oferecer condições materiais aos revoltosos, agindo com entusiasmo, dizem alguns historiadores. Por isso foi condenado à morte, porém, como vários outros, teve a sentença comutada em prisão perpétua, que seria cumprida em Portugal, mas passou apenas cerca de 15 anos no xadrez e voltou ao Brasil no começo do século XIX.
Ao contrário de Inácio Rolim, o mineiro não era boa bisca.
Seguindo conduta corriqueira da época, viveu maritalmente com Quitéria Rita. Com quem? Uma das filhas da famosa Chica da Silva, a charmosa e esperta mulata, transformada em mito, ao quebrar paradigmas da sociedade colonial. Amasiada com um rico português, teve com ele muitos filhos e filhas, herdou vastas terras e escravos, participou de instituições até então privativas de gente de pele branca. Pois bem, padre Rolim, o mineiro, viveu com Quitéria Rita, 20 anos mais nova, gerou filhos numa boa, deixando herdeiros de sangue. Seus bens foram sequestrados pelo governo de Portugal e ele só conseguiu reaver parte de sua fortuna após a independência do Brasil em 1822. Morreu em 1835, quando o nosso Inácio, já ordenado padre no Seminário de Olinda, em plena repercussão dos movimentos rebeldes de 1817 e da Confederação do Equador, nos quais foram presos, condenados e mortos vários padres, sem que se tenha notícia da participação de padre Inácio Rolim.
O padre Rolim inconfidente foi, sem dúvida, uma figura controversa, como é fácil perceber por essa amostra de sua vida. Uma coisa é certa, o mineiro não guardava nenhuma semelhante com o correto sacerdote nascido em Cajazeiras, o nosso sábio e santo padre Rolim, o filho de Mãe Aninha.
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