O acordo Igreja-Estado (parte II)
Por Padre Renato
O Acordo entre a República Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao estatuto jurídico da Igreja Católica no Brasil foi assinado aos 13 de novembro de 2008 na Cidade do Vaticano, ratificado pelo Parlamento Brasileiro aos 26 de agosto de 2009 (Câmara dos Deputados), seguido da aprovação (Senado Federal) e conseqüente promulgação do Decreto Legislativo nº 698/2009 pelo presidente do Congresso Nacional, aos 07 de outubro de 2009. Tal decreto, por força de lei, foi transformado automaticamente, no ato de sua promulgação, em Norma Jurídica, sendo recepcionado no bojo jurídico pátrio, não carecendo de sanção presidencial.
A grande celeuma gerada, desde que o assunto veio a público, foi o de que os ítens do novo diploma legal ferem a laicidade do Estado Brasileiro, podendo ser acusado de inconstitucional. Certamente algum grupo mais exacerbado entrará mais cedo ou mais tarde com uma ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) junto ao Supremo Tribunal Federal, requerendo a eliminação da legislação brasileira. Ora, nada mais fora de cogitação. O Acordo é plenamente constitucional. E, como dito acima, o Estado laico não pode se considerar “inimigo da religião”. Seria um absurdo uma nação qualquer não reconhecer o valor que a religiosidade traz consigo, mesmo do ponto de vista social, enquanto mantenedora da paz e cultora dos valores que dão embasamento ético, moral, cívico e cidadão àquela mesma nação.
Os que defendem que uma ferida no tecido jurídico foi aberta erram de forma vergonhosa, pois analisam de forma preconceituosa os aspectos pontuais do Acordo que, em síntese, versam sobre a liberdade religiosa (art. 2º), a não interferência do Estado em assuntos pertinentes à administração interna da Igreja, como a criação de dioceses e paróquias (art. 3º § 1º), a manutenção de direitos constitucionais já plenamente mencionados na Carta Magna Brasileira (arts. 5º e 7º), o reconhecimento recíproco de títulos acadêmicos (art. 9º), a obrigatoriedade do ensino religioso (aberto a qualquer denominação religiosa) na rede pública (art. 11), a possibilidade de contrato matrimonial religioso com efeitos civis (art. 12), o respeito ao segredo do ofício sacerdotal (art. 13) e a garantia de possibilidades de a Igreja melhor atingir suas finalidades evangelizadoras, incluindo aqui a imunidade tributária referente aos impostos devidos ao patrimônio, renda e serviços relacionados às atividades finalidades essenciais da Igreja (art. 15), bem como a afirmação da inexistência de vínculo trabalhista entre ministros ordenados e fiéis consagrados e dioceses, paróquias e congregações religiosas (art. 16).
Assim, o Acordo entre a República Federativa do Brasil e a Santa Sé sobre o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil é, na verdade, plenamente constitucional, é um marco histórico para a caminhada jurídica deste país que segue os passos das grandes nações que há tempos já têm seus Acordos firmados com protestantes, muçulmanos, espíritas e tantas outras vertentes cristãs e religiões não cristãs e abre um valiosíssimo precedente jurídico para que as outras igrejas ou comunidades religiosas possam fazer o mesmo, desde que tenham um mínimo de seriedade e organização exigidas por lei.
Jogar pedras no Acordo é não só dar um “tiro no pé”, mas também demonstrar não só ignorância política, mas também jurídica em que, sendo assim, melhor seria calar e não dar mostras públicas de tamanho disparate.
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