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Francisco Cartaxo

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No dia em Sabino Rolim não pagou o taxi

23/11/2020 às 09h14

Coluna de Francisco Cartaxo

Por Francisco Cartaxo

Sabino Rolim Guimarães estudou medicina no Recife, diplomando-se em 1946. No ano seguinte, já estava em Cajazeiras, exercitando a profissão. Chegou com especialização em oftalmologia e otorrinolaringologia ou, como se dizia na época, médico de olhos, nariz, garganta e ouvido. Foi o primeiro cajazeirense a voltar para sua terra com especialização.

Mas aqui, ele fazia quase tudo, pois dava plantão no Hospital Regional de Cajazeiras, que tinha começado a funcionar havia poucos anos. Novinho em folha. Iniciativa da Igreja, graças ao dinâmico dom João da Mata Amaral. A diocese começou a construir em terreno doado pela prefeitura, mas teve dificuldades. Então, o governo do estado assumiu o empreendimento. Deu certo. Não virou obra fantasma ou inútil. Ao contrário do nosso aeródromo Pedro Moreira, até agora serventia de ricos e políticos, o hospital transformou-se em núcleo de prestação de serviço de saúde e centro de treinamento para muitos profissionais da medicina em Cajazeiras. Deodato Cartaxo, Otacílio Jurema, Celso Matos e Sabino Rolim Guimarães muito aprenderam no HRC, sobretudo, com a vinda periódica de colegas mais experientes, com tirocínio em cidades maiores. O HRC foi uma escola.

Sabino Guimarães costumava ir ao Recife com razoável frequência. Aprimorava seus conhecimentos em cursos, conferência e estágios em hospitais, enfim, atualizava-se no campo médico e, também, na política. Revia colegas e os ambientes com os quais se familiarizara ao longo de sua vida estudantil. Isso foi sua rotina durante anos a fio. O Recife, ele costumava dizer, lhe proporcionava um banho de civilização. Só Deus sabe quais eram os parâmetros dessa tal de civilização…

Fato curioso se deu numa dessas viagens.

Certa vez, muitos anos depois de deixar a vida escolar, ao descer do taxi, o motorista se recusou a cobrar pela corrida. Ora, doutor Augusto, pra mim é uma honra transportar o senhor no meu carro. Que é isso, amigo, você está no seu trabalho, responde Sabino, já com a carteira de cédulas na mão. Não houve jeito. O taxista não aceitou receber o dinheiro. Restou a Sabino agradecer e seguir seu destino. Meio desligado, desde sempre, Sabino ficou ruminando. Porque diabo esse cidadão não quis cobrar. Seria ele algumas daquelas pessoas anônimas que, por acaso eu cheguei a atender na época de estudante? Puxa pela memória. Nem a fisionomia do taxista nem a curta experiência de prática como universitário lhe davam a mínima pista. Nada. Aquilo ficou azucrinando o juízo do médico cajazeirense.

À noite, na recepção do hotel do Hotel Central, que ainda hoje existe na rua Manuel Borba, no centro do Recife, onde costumava hospedar-se, Sabino puxa conversa com o rapaz da portaria. Lá pras tantas, pergunta se ele conhece algum doutor Augusto. O moço abre o rosto num riso largo. Conheço, doutor, conheço… e aqui no Recife todo mundo conhece. Ele é irmão do senhor? Como, o quê, espantou-se Sabino. Ele deve ser irmão ou primo do senhor porque ver a cara de um é mesmo que ver a cara do outro. Não me diga que o senhor não conhece o doutor Augusto Lucena?

Desfez-se o mistério.

Augusto Lucena era um político muito popular no Recife. Advogado, por coincidência, paraibano e da mesma turma do irmão José Rolim Guimarães. Foi delegado de polícia, deputado estadual, vice-prefeito, prefeito duas vezes e deputado federal. Naquele dia Sabino Rolim andou de taxi, de graça, às custas de ser figurinha repetida.

Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
escritos.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

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Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
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