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Francisco Cartaxo

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Mataram meu amigo Jorge

26/10/2018 às 21h07

Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff.

A frase é do deputado Jair Bolsonaro, pronunciada na Câmara Federal, no dia 17 de abril de 2016, ao votar a favor do impeachment da presidente Dilma. O coronel Brilhante Ustra (1932-2015) foi comandante do DOI-CODI de São Paulo, de 1970 a 1974. DOI é o Destacamento de Operações e Informação e CODI, Centro de Operações de Defesa Interna, criados em 1970 por meio de instrumentos legais secretos, com a finalidade de investigar ações contra a ditadura. No exercício dessa tarefa, era comum o uso da tortura, que, em alguns casos, levava à morte do preso.

Meu amigo Jorge morreu na tortura.

A notícia de sua morte chegou do Rio, sem aviso prévio, em lacônica comunicação oficial. Problemas cardíacos. Tempos depois, no entanto, a verdade foi sendo revelada pouco a pouco. Verdade cruel. Alguém o viu entrar na sala da tortura, já muito machucado. Depois ouviram gritos de dor e angústia. Urros, mais do que gritos. Submetido a processos primários de aniquilamento físico e psicológico, Jorge não abriu a guarda. Falou o que poderia dizer sem comprometer seus companheiros. Resistiu até o limite de suas energias. Jorge foi um dos primeiros presos políticos a morrer nos porões da ditadura, antes do AI 5, quando sequer tinha sido criado o DOI-CODI.

Quem era Jorge?

Um jovem de sólida formação cristã, moldada na Juventude Estudantil Católica (JEC) e na Juventude Universitária Católica (JUC). Integrou o núcleo baiano que estruturou a Ação Popular (AP), no início da década de 1960. Mais tarde, parte de seus militantes migrou para o PC do B. Jorge foi trucidado na prisão antes disso. Engenheiro, trabalhou na Petrobras, em Salvador, mas logo após o golpe de 1964 foi expulso, junto com outros colegas, entre os quais o cearense Eudoro Santana, pai do atual governador Camilo Santana. Livre da cadeia, trabalhou na empresa de energia elétrica da Bahia. Portanto, Jorge não era clandestino, quando o prenderam de novo. Nem terrorista nem guerrilheiro.

Passados mais de 50 anos, trago na memória a dor da estúpida morte de Jorge na tortura, o mais abominável dos atos praticados pelo homem. Ato ignóbil. Covarde. Abjeto. O torturador é um ser desprezível, tanto quanto aqueles que consideram heróis quem tortura, como fez Bolsonaro na sessão da Câmara que votou o impeachment de Dilma.

Saudade da ditadura?

No dia 11 desde mês, Jair Bolsonaro admitiu que o seu objetivo é criar um Brasil semelhante àquele que tínhamos há 40, 50 anos atrás. O Brasil do AI 5? É disso que o povo brasileiro precisa? O Brasil não quer um regime de exceção, com a quebra da harmonia entre os poderes, censura à imprensa etc. etc. Muito menos o uso da força para fechar o Poder Judiciário, tal como pregam o filho e outros partidários de Bolsonaro. Na época dos sonhos de Bolsonaro, o povo não votava para presidente, governador e prefeito das capitais. Se um deputado contestava o regime, podia ser cassado em rito sumário, sem direito de defesa. Não, o povo não tem saudade desse tempo! Não se apaga a História.

Impossível esquecer a morte de Jorge.

Essas coisas me chegam forte à mente, quando vejo a arrogância do candidato, gritando como quem dá ordem unida em quartel, a fazer o gesto-símbolo de sua campanha. Atirar em quê? Na democracia, é claro. Embora seja crítico do PT e dos desvios das gestões petistas, como registrei em dezenas de artigos, neste domingo voto 13 Haddad.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
escritos.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

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Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
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