A máquina vai financiar a campanha?
Narro uma história vivida e não por ouvir dizer. Em 1982, com a candidatura a prefeito de Cajazeiras já homologada pela convenção municipal do PMDB, fui procurado por um conterrâneo quedespontava como empresáriode sucesso, mercê do espírito de iniciativa, capacidade e enorme disposição de trabalho. A conversafoifranca e direta.
– Frassales, acho que você é a melhor opção pra Cajazeiras.Eu vou contribuircom um milhão de cruzeiros,mas vou repassarem quatro parcelas iguais até novembro.Certo?
Agradeci a grande colaboração. O PMDB estadual me prometera uma cota mensal, mas eu sabia da fragilidadefinanceira do partido.
– Você me ajudou quando eu muito precisei e agora é minha vez de retribuir.
Disse e relembrou um episódio da época em que eu era secretário de Planejamento do governo de Ivan Bichara. Um pleito seu estava dormindo na gaveta de autoridade estadual, só precisa uma palavra minha, esclareceu, não estou pleiteando nada ilícito, o processo está de acordo com as normas, mas o homem não me conhece, está com receio de autorizar.
– Eu só quero que você diga a ele quem eu sou.É só isso o que eu lhe peço.
Telefonei sem sobrosso.
Conhecia o interlocutor, meu parente, um jovem sério e dinâmico. Isto eu transmiti à autoridade de cuja decisão dependia a criação de empresa prestadora de serviço na área de segurança privada. Minha palavra funcionou com um aval. Aliás, era o que faltava a meu colega do secretariado, até ali, temeroso de tomar uma decisão forada rotina de seus afazeres burocráticos como auxiliar de Ivan Bichara. Eu praticara o gestosem interesse subalterno. Minha intenção era contribuir para o nascimentode importanteempresa de um cajazeirense que precisava diversificar suas atividades empresariais.
Deu tudo certo.
O próprio secretário responsável pela autorização até me agradeceuas referências dadas. Passados mais de quatro anos daquela conversa, meu amigo recordou o episódio e, como gratidão, tomou a iniciativa de colaborar com as finanças de minha campanha a prefeito de Cajazeiras. Não demorou, recebi o primeiro cheque no valor correspondente a 25% da quantia por ele mesmo estipulada.
Contudo, a ajuda encolheu,parou aí.
Certo dia, aí pelo mês de setembro, o jovem empresário de sucesso me disse – entre gaguejos, reticências e pedidos de desculpas -, que lamentava não ter condições de cumprir sua promessa. Estava sofrendo enorme pressão de Wilson Braga (candidato do PDS a governador) e alguns deputados por financiamento de campanha. Estava esgotado. Compreendi logo. Ora, minha luta estava mais para Dom Quixote e meu candidato a governador, Antônio Mariz, marchava para uma anunciada derrota no pleito de novembrode 1982, tão forte era a influência do poder edas regras eleitorais herdadas da ditadura, àquela altura ainda viva: vinculação partidária de votos, sublegenda e restrições à propaganda eleitoral.
Entendi suas razões.Nem sequer fiquei puto com meuparente.
Narro este caso para realçar a facilidade aberta aoscandidatos apoiados pela máquina pública. Ontem e hoje. Se o postulante a prefeito, porém, tem reais chances de sair vitorioso, o panorama pode mudar. E mais, a manipulação do dinheiro público é cada vez mais difícil após a proibição, este ano, de doações de pessoa jurídica. Há outro fator, Justiça Eleitoral e o Ministério Público têm agora grande capacidade de fiscalização e o cidadão mais liberdade de denunciar. Mas isso fica para depois.
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