Estranho mundo!

Por Mariana Moreira – O sonho me leva a uma realidade estranha. O cenário é comum. Ruas, automóveis, praças, casas calçadas, lojas, quiosques. O inusitado e estrambótico remete as pessoas. Individualmente, ou em grupos. Caminhando em calçadas, sentadas em bancos de praças ou dividindo uma mesa no botequim todas tem suas atenções, gestos e movimentos concentrados e dirigidos a um minúsculo engenho que portam e que exige total e exclusiva atenção.
O engenho exige dedos ágeis para ser manipulado. Assim, os de mais idade já revelam os sinais dessa exigência, apresentando dedos tronchos que buscam agilidade de movimento no esforço de manuseio da minúscula tela que revela mundos outros, distantes, frios, inertes, pois separados e despidos de calor, sabor, cor, cheiro e, sobretudo, de sentido humano.
E vageando por esse mundo de estranha realidade encontro uma significativa quantidade de adolescentes e jovens adultos cuja juventude já revela o peso de um tronco encurvado, como a desdenhar de milhões de anos de evolução. Uma trajetória que nos leva aos nossos antepassados que, apoiados nas patas traseiras, se erguem e, usando as mãos como ferramentas, passam a enxergam o mundo com uma postura ereta e altiva, nos distanciando, na linha civilizatória, das outras espécies com quem, outrora, partilhamos cavernas, frutos e caçadas.
E, caminhando por entre espaços irreais desse sonho mítico manifesto um cumprimento de bom dia, tendo como retorno apenas e somente um murmurar quase inaudível como se a minha gentileza em ver nos demais meus iguais, traduzisse uma intromissão e uma ofensa por quebrar a “harmonia” daquele mundo. E um sentimento de estrangeirice e de abandono começa a me asfixiar a respiração e o pulsar do coração no peito.
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De repente, em meu vaguear errante tenho a atenção despertada por uma estridente buzina. Um automóvel passa em frenética carreira. Seus ocupantes, todos, também portam o minúsculo engenho e todos tem suas atenções e gestos concentrados na pequena máquina, que ganha proporções quando se torna o centro da ação e da atenção humanas. Estranho mais ainda é que a própria máquina é também condutora do automóvel e, assim, seus passageiros podem, todos, gozar do desfrute de viver neste mundo nada admirável de indivíduos isolados e encarquilhados.
Minha gata Burralho pula na cama e me desperta do sonho. Aquieto meu coração com o seu ronronar e solto um suspiro de alívio. Ainda estou no mundo de humanos e bichos. Mas, chegando no Campus da Universidade para mais um dia de trabalho docente me deparo com grupos de pessoas e indivíduos isolados que, todos, com suas atenções concentradas em pequenos engenhos que manuseiam com destreza e isolamento, percebo que esse “admirável mundo novo” é bem real. E penso como Aldous Huxley que “Quanto mais poderosa e original for a mente, mais ela se inclinará para a religião da solidão”.
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