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Mariana Moreira

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Entre juremas e algodoais

21/06/2024 às 19h12

Coluna de Mariana Moreira - à esquerda: foto da jurema - crédito: Fábio Vieira – UFRN, e à direita: foto do plantio de algodão, arquivo/Agência Brasil

Por Mariana Moreira – De repente a caatinga de veste de branco. Espalhado por chapadas, várzeas, morros e serras um manto de flores brancas traz a memória lembranças de um tempo em que o algodão dominava a paisagem sertaneja e, entre os meses de junho, julho, agosto e setembro, florescia e desabrochava em fibras que tornavam mais luminosas as noites sertanejas de lua cheia. As flores atuais são das juremas que, neste período do ano, dominam a paisagem do sertão. A planta, nativa da caatinga e responsável pela redução dos dramáticos efeitos da devastação desse ecossistema, divide espaço com áreas de pastagens artificiais.

O algodão desapareceu do cenário do sertão nordestino. A desestruturação da atividade econômica foi amenizada, décadas depois, com os benefícios previdenciários estendidos a população rural e, mais tarde, com a concessão de programas sociais de distribuição de renda com as camadas populacionais mais fragilizadas. O cultivo do algodão que riquezas promoveu entre grupos sociais da região, sobretudo, aqueles que se beneficiavam dos investimentos e financiamentos públicos, não encontrou alternativa capaz de superar sua dimensão e extensão. A praga do bicudo, cujo controle exige conhecimento tecnológico, investimentos e consideráveis somas de recursos, foi uma chaga avassaladora entre pequenos e médios produtores sertanejos que, inertes, assistiram seus algodoais murcharem ante a devastação do besouro. Impotentes, restou apenas o lamento.

E os campos sertanejos atualmente esbranquiçados pelas flores dos juremais resgatam lembranças da infância quando, nos finais de tarde, durante a colheita do algodão, nos deliciávamos com a algazarra que os apanhadores de algodão promoviam em torno da balança de corda instalada no galho da cajazeira no terreiro de nossa casa em Impueiras. Os gracejos, as brincadeiras, as troças animavam homens e mulheres com seus trajes remendados, seus lençóis e bornais encardidos e suas cabaças envoltas em estopas para refrigerar a água que saciava a sede nos roçados. Lembrança de Antonio Borges que, em um canto, acendia o cigarro de palha no artifício feito de chifre de boi enquanto resmungava maldizendo a vida e traçando planos imaginários de migrar para São Paulo, desejo que concretiza em um ano de seca.

O fim da cultura do algodão no sertão nordestino não esgarçou apenas a vida econômica no Semiárido. Mas estilhaçou também estilos de vida e normas de convivência. Hoje, nos campos sertanejos, o cantar dos apanhadores de algodão foi substituído pelo mugido do boi e o ronco das motocicletas que esquadrinham todos os recantos da região.

Ficou apenas uma nesga de saudade, reavivada nos acordes da sanfona e da voz marcante de Luiz Gonzaga:

Quando chega o tempo rico da colheita
Trabalhador vendo a fortuna, que beleza
Chama a família e sai, pelo roçado vai
Cantando alegre ai, ai, ai, ai, ai


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.


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Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

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