Encontros marianos
Período natalino, tempo de dar e ganhar presentes. Presentes que podem ser traduzidos na singeleza de gestos verdadeiros, no calor de abraços partilhados, no afeto de mãos entrelaçadas. Ou simplesmente em um livro recebido como gentileza pela comunhão de idéias, letras e sentidos.
Assim, lentamente, vou degustando “Um Novo Mar de Poesia”. O livro me chega às mãos pelo professor Zé Antonio, que recebe da autora esta tarefa. O livro me foi entregue ainda no calor e nas brumas das fogueiras de São João e, desde então, com a paciência de ermitã, vou me enfronhando em cada página, me misturando com as letras que formam palavras, que associam frases, que fazem vida e sentimento em verso e prosa.
Versos e prosas que me transportam para as bocas de noite de minha infância quando a bruxuleante luz das lamparinas emoldurava a voz de papai que, entrecortada pelo ranger da rede no armador da parede, tangia saudades nos versos de Leandro Gomes de Barros e seu Suspiro Sertanejo. Ou para as histórias e sagas de cangaceiros, romeiros, penitentes e visagens que habitavam imaginários e realidades sertanejas.
E assim, devagar e sem pressa, a leitura de “Novo Mar de Poesia” vai preenchendo de pulsações os espaços e vazios que o cotidiano de pressas, dos instantâneos e das individualidades teima em fazer natural. Cada estrofe, cada parágrafo desenhado como a arte de fazer da escrita a essência da vida, tem a mágica capacidade de nos revelar sonhos, esperanças, inocências numa página de livro tingida de letras e gravuras.
Sua autora, uma jovem advogada, traz nas veias a seiva da terra que lhe deu nascença. Misturado ao vermelho do sangue vasos e canais transportam a força da babugem de mata-pasto que irrompe o calcinado solo sertanejo nas primeiras invernadas. Em sua pele alva resplandece tostadas caras e rugas de tantos homens e mulheres que, desafiando natureza e estranhas forças políticas, se fazem gente em tantas marias e josés. A autora revela na sua escrita a paixão pelo lugar de nascimento, ou seja, sua querida Tuparetama, nos carrascais do Vale do Pajeú, em Pernambuco, canto de tantas vozes e melodias que, nas errâncias do país, levam saudades e lembranças de beatos e devotos, de rezas e reisados, de novenas e cantorias, de meninos e passarinhos que migram em sonhos e desejos.
E assim, neste Natal, o livro de Mariana Teles, cuja escrita ganha novas dimensões nas ilustrações de Marcos Pê, talentoso artista plástico cajazeirense que as terras piauiense nos roubou em degredos e arribaçãs, me traduz o mais verdadeiro presente. Um presente que se faz história em dedicatória de quem “se revela minha fã”. Não vejo razões para tanto, mas me alegro com sua sensibilidade em traduzir, na singeleza das palavras, a grandiosidade dos sentimentos que nos fazem humanos e plenos de possibilidades.E para deleite dos meus minguados leitores, um pouco da poesia de Mariana Teles:
Meu destino antes já era traçado
Na força do sangue e da geografia,
Que eu sou do ventre que gera poesia,
Pátria dos poetas, berço consagrado!
Até o meu choro foi cadenciado,
No som da viola que eu ouvi tocar,]
Fui predestinada a ir, mas voltar,
Pra pisar nos rastros que eu deixei no chão,
Meu sonho é do mundo, mas sou do sertão,
Minh’alma não gosta da beira do mar.
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