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Francisco Cartaxo

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Conversas com padre Gervásio Fernandes

02/12/2019 às 08h14

Escrevo estas linhas, na expectativa da chegada das trovadas de final de ano em Cajazeiras, onde me encontro. Até agora a trovoada não veio, apenas neblinas sem força para afastar a insuportável quentura. É bem verdade que há notícias de chuvas, aqui e acolá. O calor nunca foi assim, ouço em cada esquina nas ruas de Cajazeiras, pelo menos, com a intensidade deste ano. Até o vento nordeste, o Aracati, aguardado todas as noites, parece que anda envergonhado.

Foi nesse contexto de extrema adversidade temporária da natureza que, Gervásio e eu, tivemos demoradas conversas. Tranquilas e proveitosas. Antes, oportunidades assim nunca pintaram, da maneira como engrenamos agora. Descobrimos afinidades inimagináveis. Algumas estruturais, formadoras de princípios e balizadoras de condutas pessoais. Cada um a seu modo, a exemplo de especial veneração que nutrimos pela própria mãe. Não sei em Gervásio, mas em mim tal descoberta teve o efeito de uma argamassa. Argamassa da amizade.

Gente, eu falo de monsenhor Gervásio Fernandes de Queiroga, um presente vindo de Uiraúna. Cajazeiras tem o privilégio de ser o lugar de sua opção preferencial para o exercício de sua missão sacerdotal, no sentido mais amplo dado à expressão. Na maior parte de sua vida aqui morou e, daqui para frente, me disse ele, Cajazeiras é seu domicílio e não o dividindo mais com Quixadá, sua residência habitual em muitos dos últimos anos.

Então você descobriu um novo Gervásio?
Não, leitor irônico, não se trata disso. É o mesmo e continuamos a ter divergências em vários planos. Sempre tivemos, muito embora sem torná-las públicas. No meu caso, mercê, talvez, da dosagem, herdada, de sangue indígena. As convicções de cada um persistem. A velhice não as elimina. Entendo assim pelo que leio e ouço de Gervásio, em seus arroubos, às vezes, muito polêmicos. Derivação de sua personalidade, penso, do seu jeito de ser que, aliás, tem alimentado o imaginário popular em torno de apaixonadas posições ou de desavenças, até mesmo com autoridades eclesiásticas. No entanto, não são coisas assim que desejo comentar como fruto de nossas conversas, travadas em dois dias desta semana.

Afinal, de que tratamos?
De quase tudo. Pauta livre. Livre até de preconceitos, por desventura, alimentados. Deixamos aflorar lembranças e inquietações. O começo do papo girou em torno de seu livro, lançado no dia 24, aqui em Cajazeiras: A tristeza de não ser santo. 267 páginas, incluindo pequeno apêndice e algumas fotos. Gervásio falou e eu escutei, como se fora um aperitivo intelectual para a leitura mais adiante. Nos detivemos na escrita, na melhor forma de dizer o que pensamos. Quanta afinidade! Vieram à baila, também, aspectos da história da Igreja, de figuras públicas, a respeito das quais ele fala com pleno conhecimento. E paixão. Lembramos a santidade de dom Hélder Câmara.

Padre Cícero veio à baila, arrastando o cardeal Joaquim Arcoverde. Aqui, vislumbrei zona de discordância, mas, consciente de minhas limitações, encolhi a corda, sem que ele notasse, penso, tangenciando o tema. Quem sabe, esse assunto retorne com vigor, no próximo encontro. A diocese de Cajazeiras esteve presente no nosso vai-e-vem descontraído e sem outro objetivo que não o do prazer intelectual, tentando espantar o calor, quase insuportável de dezembro, na expectativa da explosão das trovadas. De uma coisa tenho certeza: nenhuma orelha esquentou ou ardeu, durante nossa conversa.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
escritos.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

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Francisco Sales Cartaxo Rolim (Frassales). Cajazeirense. Cronista. Escritor.
Trabalhou na Sudene e no BNB. Foi secretário do Planejamento da Paraíba,
secretário-adjunto da Fazenda de Pernambuco. Primeiro presidente da
Academia Cajazeirense de Artes e Letras. Membro efetivo do Instituto
Histórico e Geográfico Paraibano. Autor dos livros: Política nos Currais; Do
bico de pena à urna eletrônica; Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras
no cerco ao padre Cícero; Morticínio eleitoral em Cajazeiras e outros
escritos.

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