Ajuda o velho, ajuda o velho!
Por Francisco Frassales Cartaxo
Eu o vejo com frequência no patamar da igreja de Casa Forte ou perto da entrada do supermercado ou, no sábado pela manhã, sentado num banquinho na feira de produtos orgânicos. Alto, magro, desengonçado, meio curvado ao andar pelas ruas aqui do bairro, onde nos encontramos, vez em quando, e paramos para um dedo de prosa. De tanto a gente conversar, viramos amigos. Ajuda o velho, ajuda o velho é o bordão que usa para pedir esmola. Nunca me pediu dinheiro, mas lhe entrego algum alimento, quando saio da padaria ou do supermercado. É tão usual essa prática que, vez por outra, ele me encomenda: doutor, traga uns biscoitos… daqueles de limão.
Nos conhecemos há muitos anos.
Semana passada, me mostrou a perna cheia de veias salientes. Ia para a UPA tentar ser medicado. Não estava com cara triste de quem implora piedade. Não usa essa máscara. Queria conversar. Eugênio veio falar de novo: Olhe lá, é o capitão na cabeça… tá chegando o dia, vamos dar uma surra nesses comunistas do PT, me disse, imitando a voz e o gesto, as mãos em jeito de arma de fogo. E arrematou: ele pensa que eu sou do lado dele…
– E aí, você disse o quê?
– Nada, eu ri e fiz assim, me respondeu, levantando o dedo polegar em sinal de OK, para enganar Eugênio.
Eugênio é um colega da caminhada matinal na Praça de Casa Forte, bolsonarista fanático, desses que irrita qualquer interlocutor. Vazio de argumentos, só sabe falar chavões a respeito de Lula: maior ladrão, prisioneiro, preguiçoso, comunista safado, mentiroso, demagogo, governou para os banqueiros, mandou dinheiro para Cuba, Venezuela etc. etc. É tudo tão repetitivo que causa bocejo, enfado e pena. Pena de sua dificuldade de enxergar a realidade. Diante de qualquer contestação, berra: e o PT? Tal qual um papagaio, usa fórmulas vendidas em redes sociais. Um devoto do nada. Seria até monótono se não embutisse o vírus da mortífera destruição da liberdade e dos valores democráticos.
– Então, você não vota no capitão, perguntei?
– E eu sou burro? O senhor já reparou no olho de Lula quando fala na televisão? Eu olho bem dentro do olho dele, Lula passou fome, doutor, quem nem eu, sabe o que é sofrer, arribou daqui num pau-de-arara pra São Paulo mais a mãe dele… e hoje? Tá lá em cima, mas não esquece os pobres. A fome, doutor, a gente nunca esquece. E emendou, eu mais a mulher vai cedo votar no velho, de novo!
Alto, magro, andar desengonçado. Parou e deixou sair o riso maroto.
Autor do livro Política nos currais
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