A banana divina
Por Mariana Moreira
E Deus é brasileiro. Ora, quem inventou essa história estava tirando um belo sarro de nossa cara. A invenção da nacionalidade brasileira para o Divino se justificaria pela exuberância inebriante da paisagem brasileira que, em sua diversidade e pluralidade de cenários e contextos, repetiria o Éden em várias proporções e dimensões de grandeza e plasticidade.
Mas o sagrado é violando e estuprado de forma ignominiável. Nossas matas sangram com os primeiros colonizadores que cristianizam gentis e usurpam o vermelho do pau brasil, deixando como insígnia feridas e ulcerações que permanecem até hoje na atlântica mata restrita a insignificantes reservas. Depois, o brilho do ouro viola o paraíso, morada do Deus brasileiro, em entradas e insurreições. Bandeirantes, desbravadores, heróis nacionais. Suspensos no panteão da glória nacional abrem as portas do paraíso e escancaram a morada divina nos pantanais, caatingas, cerrados, amazonias. Tudo se transforma em fronteira agrícola onde o transgênico altera ecossistemas, expulsa posseiros, elimina sem terras, extingue espécies. Brotam safras recordes ao som de maquinários de última geração. Enquanto Deus assiste, desconfiado, a casa que lhe nominaram de morada e a pátria que se arvora de sua esconder-se e dissipar-se na densa nuvem de fumaça que sobe das queimadas.
Nos dias de hoje a nacionalidade brasileira do divino vem sendo usada de forma abusiva e inconsequente. Em nome de Deus cometem-se os maiores estapafúrdios para justificar crimes e ocultar posturas reacionárias, conservadoras, fascistas, homofóbicas, criminosas. Em nome de Deus condenam-se inocentes, caluniam-se desafetos, usurpam-se lugares e posições legitimamente conquistados. Covardemente abrigados no manto divino miseráveis deliberam que pobreza, fome, doença devem permanecer como o fértil solo onde brota e se institui o mandonismo e a prepotência. Sob as bênçãos do divino pai brasileiro condenam à invisibilidade e à condição de reses milhões de pessoas desprovidas de qualquer traço de humanidade.
Ora, em nome de Deus, do nosso Deus brasileiro, esses milhões são descartáveis e assim devem ser considerados. Mansamente, devem ser tangidos para o abatedouro. Em nome de Deus e do progresso.
O brasileiro Deus também vem sendo criminosamente utilizado como biombo para esconder e justificar atitudes e posturas pusilânimes. Nada se faz porque tudo está entregue nas mãos de Deus e ele é o senhor absoluto das vontades e destinos. As aulas de catecismo da minha infância, ministradas pelo meu pai Raimundo Moura, eram inequívocas: Deus deu ao homem o discernimento para conduzir sua vida fazendo as escolhas entre o bem e o mal, o certo e o errado, o justo e o ignóbil. Escolhas que se refletem em consequências e atitudes. A justiça, a dignidade, a humanidade não são construção divinas, mas artefatos humanos produzidos pelo livre arbítrio que recomenda e aponta estes como caminhos sensatos para sermos dignos da filiação divina.
Afinal, Deus, ou os deuses de todas as cores, formas, nacionalidades e expressões, não toleram passividade, covardia, sacanagem.
Por tudo isso, Deus deve estar dando uma bela banana para sua nacionalidade brasileira.
E tenho dito!
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