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Adjamilton Pereira

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Variações de um mesmo tema

06/07/2010 às 06h52

Um cheiro de fogueira invade as narinas. Uma tênue fumaça derradeira lembra que as festas juninas são lembranças. Um balão atrasado corta a imensidão escura do céu na direção de um tempo perdido e proibido. Os últimos acordes da sanfona ainda ressoam nos ouvidos, invadindo lembranças e revitalizando imagens que o tempo insiste em preservar no esquecimento. Os amores que os xamegões e arraiais produziram se dissipam em encontros fortuitos e compromissos nunca firmados.

Findas as festas juninas restam os últimos espocares dos fogos que celebram as vitórias e dissabores do futebol que ainda vive o clima de copa do mundo. Na ressaca das festas juninas e do futebol mais uma nova festa se anuncia. A campanha eleitoral se avizinha com suas promessas, seus espetáculos, suas performances. Juramentos serão celebrados e fragilmente cumpridos. Biografias serão maquiadas e vendidas como autênticas e definidoras de perfis de aguerridos defensores do povo. Nos palanques e nas mídias programas e projetos anunciarão a redenção de todos os males e mazelas sociais, econômicas e culturais. Como nas arenas romanas, ao povo serão dispensadas as medidas homeopáticas e necessárias de pão e circo. O espetáculo reserva lugares marcados em reconhecimento pela distinção econômica e importância política.

Nesse ritmo de festas, São João, futebol e política são apenas variações de um mesmo tema. A espetacularização da vida transformando tudo em festas e supérfluos descartados como se esvai no ar a fumaça das fogueiras juninas.

Nos versos do poeta pernambucano Manoel Bandeira o melhor sentimento para manifestar a sensação desses tempos:

Profundamente

Manoel Bandeira

Quando ontem adormeci/ Na noite de São João.

Havia alegria e rumor/ Estrondos de bomba luzes de Bengala.

Vozes, cantigas e risos/ Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei/ Não ouvi mais vozes nem risos.

Apenas balões/ Passavam errantes.

Silenciosamente/ Apenas de vez em quando

O ruído de um bonde/ Cortava o silêncio/ Como um túnel.

Onde estavam os que a pouco/ Dançavam/ Cantavam/ E riam

Ao pé das fogueiras acesas?

– Estavam todos dormindo/ Estavam todos deitados.

Dormindo/ Profundamente.

Quando eu tinha seis anos/ Não pude ver o fim da festa de São João.

Porque adormeci.

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo.

Minha avó/ Meu avô/ Totônio Rodrigues/ Tomásia/ Rosa.

Onde estão todos eles?

– Estão todos dormindo/ Estão todos deitados.

Dormindo/ Profundamente.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Adjamilton Pereira

Adjamilton Pereira

Adjamilton Pereira é Jornalista e Advogado, natural de Cajazeiras, com passagens pelos Jornais O Norte e Correio da Paraíba, também com atuação marcante no rádio, onde por mais de cinco anos, apresentou o Programa Boca Quente, da Difusora Rádio Cajazeiras, além de ter exercido a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cajazeiras.

Contato: [email protected]

Adjamilton Pereira

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Adjamilton Pereira é Jornalista e Advogado, natural de Cajazeiras, com passagens pelos Jornais O Norte e Correio da Paraíba, também com atuação marcante no rádio, onde por mais de cinco anos, apresentou o Programa Boca Quente, da Difusora Rádio Cajazeiras, além de ter exercido a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cajazeiras.

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